quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Amizade

Oscar Wilde certa vez escreveu ao final de seu texto: “...a normalidade é uma ilusão imbecil e estéril.”
Esta é uma frase que realmente me toca. De fato todo o texto dele me toca, sobre amizade. Daí eu fico assim, pensando sobre como escrever sobre amigos.
Nunca encontrei muitas palavras, sempre fui de poucos chegados – aqueles com os quais realmente podemos contar, ir na casa, rir junto, chorar no colo, abraçar sempre, pegar na mão sem medo, dar carona sem cobrar, pedir favores sem ser questionado, às vezes levar um puxão de orelha, mas jamais ser julgado... Este tipo de amigo.
Meu hall de amizades sempre foi restrito, talvez pela minha cabeça meio desmiolada, pouca gente se dá bem comigo. Esta foi a conclusão mais certa que pude obter sobre isto, não sou eu quem exige, mas os outros que não encontram o que esperam.
Eu não sou de farra, não sou de bebedeira, não sou de futilidades...
Gosto de boas músicas, levo a vida com um pouco mais de seriedade, adoro a sobriedade das coisas, sou extremamente caseira, aprecio uma boa conversa, falo besteiras sensatas e tenho as curiosidades e dúvidas mais maduras possíveis.
Isto faz de mim um alguém com espírito velho, como dizem.
Há quem me julgue pelos meus amigos. Há quem critique minhas amizades.
Me dou bem mesmo com pessoas bem mais velhas do que eu, para mim são estas as que me oferecem o que procuro!
Infelizmente há sempre um para dizer: mas que absurdo estes velhacos andarem contigo!
Outros criticam dizendo: Credo! – como se minha opção fosse a mais insensata e incabível.
O fato é que amo os amigos que tenho e o que me importa é que são eles que estão comigo.
No final do dia quem critica e julga fica sozinho. A crueldade da língua fere mais a alma de quem profere as palavras do que a quem ouve.
E eu vou pra casa dos que me querem bem e que me aceitam, mesmo com todas as diferenças – que só os hipócritas sabem ver com suas pupilas diminutas.
Eles são loucos e santos, tudo o que eu preciso!
Eles podem não ser perfeitos, podem até, talvez, não irem pro céu, mas posso afirmar com toda a certeza que eles fazem da minha realidade um paraíso profundo dos que sabem ser loucos dentro da seriedade que é necessária ter neste mundo!
Porque no final das contas, é isto o que importa...
Obrigada pela amizade de vocês.

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Daddy Issues

Um dia me disseram que por trás de um grande homem há sempre uma grande mulher, nunca fui totalmente crente nessa frase, embora nunca desacreditei totalmente essas palavras.
Pois bem, a vida tratou de me provar algo diferente dessa frase, não em essência, mas sim em sentido! A receita para ser um homem de merda é ter uma péssima mulher ao seu lado. Sim, essa é a verdade crua.
Mulheres podem ser péssimas mulheres por diversos fatores, podem ser folgadas, podem ser infiéis, ou podem  simplesmente ser pouco para os seus anseios, mas acredite esses tipos são os menos perigosos. As piores são as fodidas, sim, aquelas que têm a cabeça fodida, cheias de problemas que nem elas mesmas acham a causa.
Fato é que assim como nós homens temos uma ligação especial com a mãe, explicada pela psicanálise através do complexo de Édipo, as mulheres também tem essa ligação, tendo como figura de referencia o pai. O problema real mora na relação dela com o pai, portanto mulheres com um péssimo relacionamento com o pai durante a infância tendem a ser uma bela receita de merda com recheio de bosta! Não que toda mulher com um pai ausente, ou abusivo durante a infância vá se tornar uma esposa medíocre, mas é o caminho que tendem a seguir.
Mulheres com Daddy Issues tendem a projetar qualquer comportamento masculino nos comportamentos de seus pais. O que invariavelmente fode qualquer relacionamento, e possivelmente fode a cabeça de quem esta puxando o barco, no caso, o homem que tenta exaustivamente provar a ela que seus comportamentos são dignos, sem entender o porque de tantas discussões sem sentido. E, por mais que o cara tente demonstrar incessantemente o quão bom é, e o quanto pode ajudá-la de nada adianta. Esse tipo de mulher será sempre uma cega quando se tratar do seu próprio interior. Para ela sua relação com o pai foi uma merda e mesmo assim ela suportou tudo isso. Elas se sentem sobreviventes (muitas vezes com toda razão), e esquecem de olhar as marcas que aquilo deixou, e como isso interfere nos relacionamentos presentes.
Infelizmente, ao tentar se relacionar seriamente com uma mulher com Daddy Issues você estará tentando atravessar o Saara a pé. Conseguir é até possível com muita sorte, mas você irá se foder muito, e ser privado de muita coisa pelo percurso! Enquanto a própria não enxergar como ela projeta o relacionamento com o pai no seu relacionamento conjugal não existe maneira de ajudá-la. Resolver a própria merda já é complicado, e exige paciência, agora se imagine durante muito tempo tentando resolver a merda da cabeça de outra pessoa, que nem ao menos enxergar a proporção da bagagem que carrega. Tenso, né?
Portanto, se eu aprendi alguma coisa dentro de relacionamentos e sobre se apaixonar é perguntar. Sim, pergunte: Querida, como é o seu relacionamento com o seu pai? Você se dá bem com ele? Como ele foi durante a sua infância?. Acredito realmente que este seja um bom primeiro passo antes de se apaixonar.
Mulher com Daddy Issues mal resolvido é coisa pra psicólogo, padre, pai de santo, ou qualquer alma benevolente não disposta a ser feliz! 



PS: E antes que apareça alguém me xingando nos coments, a recíproca é verdadeira para os homens. Complexo de Édipo mal resolvido também é foda!


Culpa.

Solidão, palavra difícil de ser realmente analisada.
Qual o significado da dor de quem é só? Quais os termos apropriados? Quais os carinhos que faltam? Quais as conseqüências da falta de algo?
Ser só é uma questão de estar vivo; estar só numa existência precária de quem jamais irá dividir todos os pensamentos, as dores, amores e felicidades com alguém.
A solidão pode ser compartilhada, mas jamais vivida junto. Ela é única, e só quem a sente sabe a dor que é estar solitário.
A falta de um amor, a falta de uma mãe, de um pai, de alguém, a falta de um animal, a falta de um irmão, a falta de um amigo...
Cada um tem um tipo de solidão, cada solidão tem uma causa.
Não sei qual o remédio para esta dor, para uns fazer o bem e a caridade ao próximo é o que os mantêm próximos de Deus, de um ser que os faz sentir um pouquinho melhores neste mundo imenso de mágoas e alegrias. Para outros não há solução senão aceitar a condição infeliz de que se é só.
Existem vários tipos de solidão: a solidão de quem é diferente, a solidão de quem é só mais um na multidão, a solidão de quem nunca encontrou um amor, a solidão de quem nunca teve um filho, a solidão de quem perdeu algum conhecido, tudo culmina na falta de algo.
Mas e a solidão de quem tem muito de uma coisa?
A maior solidão não é a do ser que se ausenta, que se faz só, que é feito só pela exclusão dos outros, a maior solidão não é a do ser que não ama, que se fecha, que se nega, que não faz, que não encontra, a maior solidão, na minha humilde opinião, é a do ser que se culpa.
A culpa isola a alma da gente, faz de nossa vivência uma coisa quase insignificante, faz com que nos sintamos menores, mais frágeis, ruins, debilitados diante de uma situação que aconteceu e que nada poderá mudar.
A culpa engole a auto-estima, liberta os monstros internos, dá forças ao mau que nos atormenta. A culpa aprisiona o espírito.
E como lidar com isto? Eu não sei.
Não há soluções miraculosas, não há remédios, não há antídotos contra o próprio pensamento da gente.
E aos poucos começamos a definhar pensando no que deveríamos ter feito ou no que fizemos de tão ruim. Um comportamento malcriado, um xingamento inapropriado, um descuido na estrada, uma morte desnecessária, tudo pode gerar uma culpa dentro daquele que se arrepende.
Há quem estude e diga que a culpa é invenção do ocidente, a igreja católica e seu Deus que vai mandar todos pro inferno se não for feita sua vontade. A culpa pelo medo, a culpa pelo que nem veio, nem aconteceu.
Seja lá a causa da dor, a solidão de quem se culpa é a maior que se pode ter.
O cobrar-se de ter sido diferente, poder ter mudado, escolhido outro caminho, retornado e voltado ao ponto de início.
Dizem que nada acontece fora da vontade de Deus, mas e as displicências? A falta de cuidado? Onde entra a real culpa do homem sobre o acontecido? Tem que haver limites razoáveis.
No oriente as pessoas também se culpam, se matam e se fecham da mesma forma por motivos diversos. Os suicidas do Japão, adolescentes que ao se sentirem fora do padrão, fora do vestibular, que por não saber o que querem, excluem-se de vez da vida.
A culpa da falta de auto-perdão.
Como perdoar-se? E se somos solitários, para quem pedir perdão? Quem ouvirá nossas desculpas e nos provará que seria daquele jeito independente de nossa vontade?
Temos que evoluir e pedir trégua para nós mesmos. Atirar-nos à solidão de quem quer conversar consigo e se escutar, ser seu próprio melhor amigo.
Temos que nos levantarmos sozinhos, porque somente nossa própria consciência pode nos livrar de tal fardo.
Pedir perdão a si mesmo é uma das coisas mais difíceis, e conseguir perdoar-se de coração é outra que, para mim, parece-me impossível.
É mais fácil perdoar o outro do que a si, porque a escolha do outro era uma simples escolha, mas a nossa era para ter sido com responsabilidade e não uma mera decisão. Nos culpamos por nos conhecermos e nos cobrarmos o melhor.
Creio que a chave para amenizar tal solidão esteja em conseguir ver que aquele foi realmente o melhor de nós.
Eu ainda não sei me perdoar por muitas coisas, porque minha cobrança é mais leve algumas horas e mais pesadas em outras.
Às vezes parece-me que só pensar que dei o melhor de mim seja uma desculpa para não me melhorar, não me policiar, livrar-me das conseqüências. Mas sei que ao mesmo tempo me equivoco e muitas vezes até me contradigo.
Porém de uma coisa eu tenho certeza: a culpa fere, castiga, impede, debilita e mata.
A pior solidão é a do ser que se culpa, porque a culpa não exclui a convivência diária com outros, mas de nossa própria alma nos afasta.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Ahhhhh Dell...



Um cão. Foi assim que defini o Dell pela primeira vez...
A verdade é que antes de ser um cão, o Dell foi pra mim um impulso. Eu, como sempre, em um momento de
tristeza pseudo revoltosa quis mandar o mundo a merda, e cheguei a milésima vez na mesma conclusão: - Pessoas não prestam, quero um cachorro!
Assim o Dell veio parar no meu carro naquela quarta feira pós plantão, pós prova, pós aula, pós apocalíptica, pós revoltosa. Quando me deparei com aquela bola branca, só me veio um pensamento: - Cão!
Primeiro, o cão ganhou nome: Dell. E a partir daí esse nome seria aquele que mais ecoaria na minha cabeça. Ainda durante a viagem fui presenteado pela primeira vez: Um vómito, e um xixi! E me deparei pronunciando a frase mais famosa dita por mim um dia: - Ahhhhhhhh Dell...
Confesso que enquanto definido como Cão, ou como Dell, pensava diariamente em devolvê-lo, vende-lo, transformá-lo em sabão, ou qualquer coisa que me livrasse dos intermináveis festivais de xixis, chinelos destruídos, ou ainda buracos no sofá! O Dell comeu (come ainda) qualquer tipo de coisa, animada ou inanimada, seja uma lagartixa, ou seja uma moeda(?), e a cada vez que isso acontecia eu me via pronunciando a famosa frase: - Ahhhhhhhhhh Dell... Era tudo tão estranho, de alguma forma aquela bola de pelos brancos só bagunçava a minha vida, mas alguma coisa me impedia de me livrar daquilo que eu mesmo havia procurado.
A solução era conviver com o problema, para isso eu e o Dell mudamos. O Dell deixou de ser só Dell, e virou Porco, Delicious, Demônio, etc... Eu deixei de ser só eu, e me tornei pai, amigo, dono, responsável. A cada dia que passava, eu aprendia a duras penas as lições que ele me ensinava, fosse através da malcriadeza, ou de "dar a patinha" quando eu pedia. Fato é que nos tornamos uma dupla. É incrível como vejo parte dos meus comportamentos nele, minha teimosia, meu gênio forte, minha determinação. Por outro lado, ele se tornou parte de mim, me vejo cada vez mais sendo carinhoso, e paciente, coisas que o Dell me ensinou.
Hoje, ainda nos estranhamos, seja pelo fio mordido do computador, seja pela minha mania incontrolável de tentar mantê-lo limpo. E, é claro que eu ainda olho para ele quando estou bravo e digo: - Ahhhhh Dell.
A diferença é que ele me responde com a cara mais arteira do mundo, e late! No fundo, fui eu que aprendi a ouvi-lo.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

No final.

Natal... É época de festejar.
Para alguns esta é uma verdade, para outros nem tanto.
Para a minha pessoa este é um tempo de despertar, como todos os dias.
Eu não sou fã de natal - a data comemorativa comercial -, não me apaixono pelos enfeites e Papai Noel pendurados para todos os lados. Mas uma coisa que me fascina são as luzes.
Luzes sempre me fascinaram, adoro andar de carro à noite e ver a cidade ao longe, com todas as suas luzes piscantes como se fossem estrelas a nascer.
Creio que Natal e Réveillon são para isso, para iluminar.
Há sim muita hipocrisia sobre todos ficarem solícitos somente nesta época do ano, porque a verdade é que deveríamos ser assim todo o tempo, mais durante todo o ano que só no final dele.
Mas como nada é perfeito, ao menos temos o natal para celebrar e podermos nos tornar mais amenos durante uma vez nestes 365 dias que nos enforcam na correria, nos afazeres, no caos do dia a dia.
Para mim Natal é para isto, para nos tornarmos melhores pessoas não só com os outros, mas conosco, com o nosso próprio Eu.
É hora de abrandar a alma e se cobrar menos, colher os frutos de todo o suor, viajar, ver os amigos, reunir a família, dizer que ama, retomar antigas lembranças, construir novas memórias... É hora de se aproximar de Deus - seja de que religião se for, seja lá qual Deus naquele em que acreditar. É tempo de se voltar para dentro de si para que na quietude das coisas em meio às canções natalinas possamos nos ver com mais clareza, anotar os defeitos - jogar fora as desavenças - melhorar as virtudes - cultivar o amor (principalmente o amor próprio) - é tempo de renovar.
Inovar e renovar com a esperança de que um ciclo realmente se fecha para que outro, com outras bênçãos, possa vir e habitar nosso lar sem o menor pudor.
A energia desta época do ano é indiscutivelmente uma das melhores que se pode sentir em termo coletivo. Todos ficam em um estado extasiado de felicidade contida de quem esperou o ano todo para finalmente sorrir.
Então tudo o que eu desejo neste final de ano, com as festa das mais diversas religiões, das mais diversas culturas, dos mais diversos desejos é que todos possam ser mais pacientes consigo mesmos.
Tracem metas que sejam cabíveis e um objetivo que realmente motive. Mantenha aquele sonho impossível aceso e aumente a força de vontade.
Olhe para si mesmo, ame-se mais, tolere-se mais, esforce-se mais, sabendo que todo o esforço já feito foi o melhor que se poderia fazer.
Aceite-se como é e aceite melhor as diferenças. Ninguém é perfeito... Mas todos podemos melhorar, sempre. Foque em si mesmo.
Deixe de lado as verdades alheias, os olhares de reprovação sobre si mesmo, quebre o espelho se for necessário e compre outro novo, inove a imagem de si mesmo, seja capaz de se ver sob um novo ângulo, dê-se a oportunidade de novas perspectivas.
Não imagine coisas impossíveis que só serão lembradas no outro Natal. Não fique esperando o carnaval chegar para novamente confraternizar... Espalhe sempre alegria.
O maior presente que Deus nos deu, além das virtudes, foi a sabedoria de saber sorrir.
Isto poucos sabem, sorrir de verdade, com a alma, com o coração.
Sorria durante todo o ano, mesmo que esteja só começando agora.
Lembre-se de chorar quando der vontade, às vezes uma lágrima contida pode sim trazer arrependimentos, não tenha vergonha de se mostrar.
Desnude-se. Permita-se.
E ame, acima de tudo, ame. Porque o amor é universal e pode ser sentido por qualquer um, mesmo à distância.
Tudo o que desejo são manhãs leves, não dias necessariamente fáceis, mas cheios de aprendizados.
Desejo que nada fique como antes, que tudo renasça, que os votos sejam feitos novamente mesmo que somente com olhares durante uma noite de verão.
E que, independente de ser natal ou ano novo, todos sempre saibam que todos os dias é dia de celebrar, de ser mais calmo, mais paciente, amoroso, menos rancoroso, mais próximo do perdão...
Que não seja só nos finais de ano que se troque palavras mágicas sobre como e o quanto se ama e se quer bem.
Eu os quero bem sempre, e sempre procuro mandar mensagens sobre isto.
Que a consciência sobre falhas seja grande, e que também saiba-se congratular, mesmo que em silêncio consigo mesmo, os ganhos que se obteve durante o decorrer das horas.
Têm pessoas que dizem não orar, não amar, não querer nada com os outros nem com nenhum Deus, mas eu digo que o simples pensar e fechar os olhos, sorrir sem se perceber, lembrando-se com carinho de alguma coisa, pessoa, momento ou fato já é em si o início de uma prece.
E desejo, acima de tudo, estes pensamentos a todos.
Porque é através destes pensamentos calmos e felizes, de completa compreensão de que se é feliz de alguma forma, mesmo apesar de todas as cicatrizes e feridas ainda abertas, que todos nos encontramos.
É bem ali, na meditação diária em que se sente uma energia boa, alguma coisa quase divina presente que estamos de fato em comunhão com Deus, com o divino.
Desejo que a vida não seja simples, mas que a maioria das noites sejam de descanso.
Este é meu pedido para O velhinho lá no céu: que meus amores que realmente tanto amo possam ter esta calmaria durante seus sonos e que ao amanhecer eles saibam: nos encontramos... E que isto lhes aumente a força e sabedoria para continuar.
Porque no final das coisas, este mundo é sim maravilhoso!!!...
E vocês sempre poderão me encontrar, em algum lugar, após o arco-íris, sempre com os braços abertos e com muito, mas muito amor para dar!

Honra e Humildade

Vira e mexe eu escrevo sobre perdas.
Este é um assunto que realmente me comove toda vez.
Seja pela sua força ou dificuldade, ele mexe comigo.
Saber perder é para poucos; numa sociedade onde fracassar não é permitido, onde não ter significa ser excluído, onde ouvir um 'não' não é aceitável, perder se torna um castigo inafiançável.
Não se ensina que o perder algo também traz junto um ganhar.
Não ensinam porque é muito difícil aceitar que perder um ente querido seja crescimento para algum parente. Nunca pensam no ganho espiritual até do que se foi.
Não ensinam porque é muito difícil ver que perder um grande amor seja para benefício próprio, já que o outro muitas vezes sai e acaba aparentemente sendo mais feliz fora do que fôra dentro. Como entender isso?
Mas o mais difícil, e ainda não pensado por mim: como é complicado perder por escolha... A escolha do renunciar, a perda por opção, por saber que é o melhor caminho.
Como conseguir ver que não ter, não chegar lá, não lutar até o final é melhor para si sem demagogias sobre covardia e medo?
Podem até dizer aqueles que sofreram que poder escolher é muito melhor do que perder sem aviso prévio.
Mas como estão equivocados!
A maior perda e o maior aprendizado está quando temos que abrir mão de um sonho, de uma conquista por sabermos que nossa jornada acabou ali. Ter a consciência desperta, ter a completa noção de que aquele foi nosso melhor e que aquilo que conseguimos foi tudo o que restou - não há mais o que ganhar, é hora de perder - isto sim é para pessoas humildes e raras na vida.
Cada vez mais o que vejo são criaturas indo em direção ao abismo e se empurrando cada vez mais para ver até onde os olhos são capazes de ir antes de serem engolidos pela própria escuridão que olha de volta.
Foram pouquíssimas, quase só uma ou duas, as que eu vi assumirem e levantarem a bandeira branca quando tudo já estava praticamente ganho.
Ter nas mãos e saber abdicar, pior, saber abdicar sem ter ganhos reais e aparentes - objetivos e concretos - naquele exato momento.
Isto, um dia, eu quero aprender: ter a valentia de quem sabe que pode e a sabedoria de quem sabe que não deve.
As perdas são inúmeras e por diversas causas, o importante é saber quando elas devem acontecer, quando poderão acontecer e quando acontecerem, que sejam superadas.
Eu admiro quem já perdeu por opção na hora exata em que deveria.
Vencedor não é aquele que levanta o troféu, mas sim aquele que sai de cabeça erguida.
A honra muitas vezes está na humildade de saber renunciar.

Arrependimento

A grama mais bonita estava sob os seus pés naquele dia, o céu mais limpo sobre sua testa, e o ar mais puro adentrando as suas narinas. Apesar de o tempo ter lhe dado expressões na face das quais não fazia muito gosto,  sabia que queimou cada lágrima derramada através do arrependimento.
Estivera pensando em como se é feliz, mesmo com tudo, mesmo sem nada, mesmo tendo somente a si mesmo como maior e único pertence. Bastou-se por um segundo, preencheu tudo aquilo que havia corrompido em si mesmo.
Até que o céu escureceu, ao abaixar o olhar viu a grama dissolver-se em um asfalto negro, a tosse deu lugar aos pulmões que antes se expandiam. Era fruto do seu pensamento, sabia ele. Conhecia tudo aquilo a ponto de identificar o que lhe perturbava a mente de novo.
Tropeçou em algo estranho aos dedos calejados dos pés. Um jarro antigo, empoeirado, tratado com desprezo pelo tempo, assim como a sua face. Curvou-se ao chão, e ao colocar as mãos naquele objeto inusitado, sentiu como se um calor fosse trazido para dentro de si. Segurou com as duas mãos e antes que percebesse dali saiu uma voz:
- Filho, me encontraste! Em meio a uma paisagem de tanto desespero, vejo que precisas de mim... Portanto, te concedo o direito a um pedido. Muda o que quiseres, muda o dia que tornou tua face triste, muda o momento da primeira lágrima, muda...
Por todo o sofrimento, por toda a perturbação do pensamento havia se tornado apático ao ver o céu enegrecer, mas precisava responder aquela proposta tão convidativa. Abriu a boca, e sentiu que se falasse as palavras despencariam de sua boca até o chão, não chegando aos ouvidos de ninguém. Estivera acostumado com essas situações, mesmo assim balbuciou:
- Qualquer coisa? Posso mudar qualquer coisa?
Esperou um instante, e dissipou da face o olhar esperançoso de ouvir alguma resposta. São os remédios, malditos remédios, nunca me servem como deveriam. Ainda escuto coisas...
- Podes pedir qualquer coisa!
As sobrancelhas se arquearam mostrando a indignação aquilo. Sua mente insana estava captando uma percepção real.
Pediu um segundo para pensar, e carregou seu pensamento ao momento da primeira lágrima. Aquela tão sofrida, que o fez perder a juízo, a sanidade, que o tornou quem nunca desejou ser. A trajetória fora tão dolorida, mas o tornou tão mais forte. Se expôs ao mundo, mas construiu uma fortaleza dentro de si mesmo. Não tinha mais quem tanto desejou ao seu lado, mas tinha a si mesmo, ainda que fosse todo esculhambado pelas rachaduras de personalidade, e insanidades passageiras. Tinha a si mesmo...
E como conviveria com o arrependimento de não querer voltar aquele a momento. O arrependimento provavelmente agravaria a sua situação tão frágil. Quisera nunca ter de decidir consertar nada... Parou.
Respirou, e os lábios se abriram novamente:
- Quero voltar a alguns minutos atrás e nunca ter tropeçado em ti.
Como combinado o jarro cumpriu sua parte...
Os minutos se retrocederam, voltou ao seu caminho, e mesmo com o céu escurecido, e o asfalto negro sob os seus pés, não carregava um novo arrependimento... Era tudo que queria...

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Almas

É incrível como certas pessoas tocam a gente.
Creio que pela correria do dia-a-dia, a falta de tempo, pelas muitas coisas para se fazer vamos ficando mais endurecidos.
Aos poucos as coisas e pessoas deixam de nos tocar, tudo fica meio banal e nada do que acontece com o outro parece nos importar de fato. É assim, em meio ao nosso próprio caos que deixamos de ver o furacão que está em volta dos demais.
Nos importamos demasiadamente com o próprio umbigo, cremos que temos todas as soluções para os problemas alheios, mas os nossos...? Ah! os nossos ninguém resolve e ninguém entende.
Então eu fico me perguntando sobre como algumas coisas de repente nos tocam mais do que outras. Como certos olhares realmente nos chamam a atenção, seja pela alegria e brilho contido neles ou pela tristeza represada em lágrimas; como certos sorrisos nos parecem mortos e outros tão vivos; como um silêncio às vezes significa tudo e como mesmo todas as palavras não seriam o suficiente para amparar determinados sofrimentos.
Muitas coisas, diversas coisas e pessoas me tocaram durante a vida, mas devo confessar que cada vez mais são menores esses toques, esses reconhecimentos almísticos de quando só o estar ao lado da pessoa já é estar um pouco mais curado dos próprios males ou só o pensar já é dividir uma felicidade que só aquela pessoa sabe como sentir assim como você.
São cada vez menores as almas que se importam, que realmente estendem a mão, que nos ajudam quando estamos no chão - mesmo que não por termos caído, mas por termos nos deitado para um simples exercício.
Um dia, assim numa tarde calorosa, eu entrei em um recinto e encontrei uma pessoa sorrindo. Desde então ela não pára de me sorrir, mesmo quando estamos em completa aflição.
Um ser iluminado que talvez nem tenha noção do tamanho de sua real natureza.
De alguma forma eu me senti conectada, nunca vou saber se é recíproco ou qualquer coisa parecida, só sei que de alguma maneira este ser me olhou na alma e eu então pude sentir a presença dele, ou vai saber foi o contrário. Não importa.
As ajudas que temos quando mais necessitamos nem sempre vêm como esperadas.
Posso dizer que muitas vezes precisei de amigos que não estavam do lado quando eu mais temia cair. Aprendi a andar sozinha, da maneira dura como sempre dizem que é a vida. Caminhei só a sós comigo e com Deus logo quando 'pequena'; já encontrei muitas outras criaturas solitárias como eu, gente que aprendeu a ficar de pé sobre espinhos de rosas - ora uma visão linda, ora uma provação tortuosa.
Alguns, talvez, tenham se desviado do caminho.
Só sei que esta pessoa, para qual dedico não só o texto, mas dou toda a minha admiração e os poucos outros recursos que posso oferecer, passou por tempestades das quais eu talvez jamais saiba qual o gosto da água, qual a fúria do vento, qual a força do frio, qual a profundidade da fome.
Têm pessoas que nos tocam.
Ao lado desta pessoa posso dizer que sou eu mesma sem medo, sem vergonha. Talvez não da forma completa como deveria, mas de uma maneira tão leve e sutil que às vezes me espanta em ter tido isto desde o começo, sem precisar de prévias apresentações, de maneirismos e tiques nervosos que fossem amenizados com o tempo, sem precisar me explicar e sem ter medo de me despir.
Esta é talvez uma das pessoas que, na vida, mais tenha me tocado.
Não sei falar detalhes, não conheço as intimidades, não sei de toda a história vivida. Mas se me perguntarem qual a alma com mais cicatrizes que eu já tenha sentido, posso dizer que foi esta.
Não sei dizer exatamente o porquê, essas coisas a gente só sente. Talvez seja pela transparência ao estar comigo - aquela transparência que às vezes mesmo querendo esconder, de relapso, a gente mostra; talvez tenha sido só um reflexo do que eu mesma tenha mostrado; talvez seja alguma coisa impossível ou inexplicável...
Seja lá o que for, de alguma forma eu sinto esta alma e ela, num dia caloroso de um meio de semana, me tocou e deixou em mim uma cicatriz que toda tarde se abre para toda noite se fechar...
Muitas vezes não temos noção do tamanho de nossa alma, e uma forma de mensurar de maneira pequenina é sabendo que tudo aquilo que se planta, um dia, colher-se-á.
O tamanho daquilo que se colhe é do tamanho daquilo que se dá.
E eu posso dizer que uma das melhores coisas na vida é poder semear quando o outro menos espera e depois colher quando jamais poderia imaginar.

Umbigo

Quando estiver só imagine somente meu ser por sobre o teu, cobre de asas os pensamentos e voa em direção ao meu umbigo.
Lambe os desejos para dentro de mim e sacia minha fome de teu corpo, suave e fresco, como o destilar mais puro já degustado por uma boca.
Arrebenta minhas algemas e sente o percorrer de minha mão por dentro de tuas costas, como quem contorce para dentro todas as unhas afiadas pela união.
Prova minhas coxas como quem sufoca o penar num delicioso pedaço de manjar e no silêncio da noite liga todas as luzes para que possa me ver bem por sob teu ser.
Acaricia a vontade de me ter para junto de teu ser, e sente no vai-e-vem a quentura de minhas umidicidades escondidas.
Fortalece o enlace e força para dentro tuas alvuras tão esperadas, tão demoradamente abstratas em meu ser.
Imagine somente meu materializar e suaviza os beijos, enaltece os abraços, me cobre de carinhos e olhares fixos de quem sabe em que pensamento me encontrar.
Sente meu corpo descendo por sobre o teu e, com todo o demorar, imagina minha boca com vontade própria parando onde queira sem paralisar qualquer movimento.
Maltrata minha nuca com puxões e beijos, arrepia minha espinha com tuas posições de acrobata e descansa por sobre meu ser todo o sono da noite.
Solta com leveza teus músculos e imagine o dormir.
Sonha por sobre meus seios com toda a noite vivida em pensamento e torna realidade o desejo de saciedade que tenho de teu ser.
Feche os olhos e dorme para que depois eu também possa te avivar e te imaginar quando nos encontrarmos no mesmo sonho, acordada ou dormindo, contigo em meu umbigo começando tudo de novo...

Quisera

Quisera deitar-me nos braços da noite maltrapilha sem estrelas e alucinada pelo vento cretino que bate em minha janela.
Quisera despir-me nas nuances das cores cruas e frias das nuvens que não alcanço descrentes e dégradés por sobre a lua que não sinto.
Como me desejaria ser nua por sobre um colchão de cetim com fios tecidos à mão por aquele que percorre meu corpo como óleo de amêndoa ao deslizar por entre minhas curvaturas.
E desfiar todas as costas daquele ser com minhas unhas afiadas, como gata que desalinha todo um sofá por puro prazer de ser.
Apanhar com a boca todas as uvas orvalhadas de seu vinho já quase como vinagre de tanto me esperar... Como quisera destacar da pele todas as cicatrizes como numa escoriação para deixar por cima o meu desenho de desejo marcado em sua história.
E ao ouvir o badalar das horas, rir freneticamente como quem entra em comunhão com os deuses ao obter o orgasmo mais sedutor de toda uma vida.
Seduzir novamente aquele que me olha e me contorcer através do frio que insiste em bater, torturando os sentidos e fazendo amor com os olhos sem piscar uma única vez.
Lamber todo o céu nublado, suado de todos os prazeres humanos dos corpos que fazem amor ao mesmo tempo transpirando e inspirando todo o perfume do entrelaçar.
Como quisera salpicar na língua todo o seu sal formado de suor e lágrimas e bailar no quintal cheio de vinhas as ruínas históricas que me trouxeram até aqui.
Um oceano de ondas magníficas, como desejaria morrer afogada!
Seus braços que embalam para frente e para trás todos os meus pensamentos hermeticamente calculados sobre o que sentir ou o que falar.
Perco os sensos e sussurro qualquer coisa, porque já não me é razoável pensar.
Meu consciente despede-se de mim e meus instintos sobram feito eternidade, um tango redundante e coerente de passos ensaiados por sobre uma cama.
Sua pequenez sabedoria sensata, deixe minha sensatez para os gnomos de contos-de-fadas.
Alucinação traçada com os dedos em todo meu corpo. Minha 'cãibrosa' barriga, sua 'arrepiosa' espinha, minhas sussurrantes falas, sua 'gemiosa' resposta não clara.
Meus ouvidos sonham ouvir seus gemidos tortuosos de falas grossas e de palavras aladas, voando para meu céu de nuvens descrentes, espantando o frio que maltrata, cobrindo meu céu de estrelas e fazendo brilhar novamente minha lua, acima de todas, para que eu novamente volte a sonhar...
Quisera me deitar por sobre os braços maltrapilhos da noite e não mais pensar, e calar, e só fazer amor com o mundo, sendo minha morte o meu gozar.
Quisera...

Escrever.

Eu não tenho muitos medos.
Meus medos são realmente poucos, mas um que sempre prevaleceu, seja por um motivo ou outro, é o de não ser boa o suficiente.
Ouvir aquele "não, você não é o que esperávamos, nem o que desejávamos, nem o que queríamos".
De alguma forma estas orações sempre me foram as piores para se ouvir.
Aprendemos a viver num mundo de "sim" e poucos "não's".
Educação ou cobrança interna, seja o que for eu pouco sei lidar com a questão do não ser o que eu mesma esperava para mim.
Eu escrevo, e meu maior sonho e maior medo é publicar qualquer coisa que seja em meu próprio país de alguma forma. O medo da rejeição.
Queria ser a melhor no que faço, queria ser boa o suficiente para ao menos publicar e vender alguma coisa, viver disto, talvez, quem sabe, um dia - assim como raros casos neste país de incultos.
A língua bela maltrata.
Maltrata meus desejos oriundos de um dom mal visto.
Mal quisto e mal falado, ou muito ruim ou muito bom, não há meio termo.
Será?
Então eu fico assim, renunciando ao meu sonho de vida pelo medo do "não".
Poderiam me dizer que até mesmo os grandes um dia foram rejeitados, isso não conforta, aflige ainda mais.
Alguns levaram anos, outros décadas, outros só após a morte.
O que me contenta é pensar que quem me lê sente algo mesmo que só um pouco.
Uma gota a menos de solidão, uma alegria a mais, quem sabe tudo o contrário, mas sempre alguma reação.
O bom da vida é isto, causar reação nas pessoas. Vê-las sorrir ou chorar ao ler algo teu. Realmente tocar aquele que lê, que te sente, que se sente no que vê.
Andei procurando umas editoras recentemente e decididamente irei mandar alguns textos meus compilados já formando um livro.
Quem sabe quantos anos passarei ouvindo "não".
Quem sabe o quanto irei me surpreender ao ouvir um "sim".
Seja lá como for, espero que valha a pena.
Espero ter condições de sempre continuar e não deixar o julgamento dos outros influenciarem minha escrita.
Porque no final é isto só o que temos, nossas convicções e nada mais.
Nossas verdades intrínsecas.
Eu escrevo, e quem me lê sabe... Sou o que digo. Nem mais nem menos.
Seja um não ou um sim, Eu sou isto e espero que palavras nunca sejam capazes de me explicar ou resumir, porque é assim que saberei que nunca irei me acabar.
Escreverei até o fim, e é escrevendo que me realizo comigo.
Este prazer somente eu sou capaz de me dar...
O orgasmo real da vida em saber que se vive tudo aquilo que se deseja viver enquanto se está vivo.
Redundância cabal e apropriada...
Eu tenho poucos medos... E espero que os poucos não sejam aqueles que definem minha vida pessimista, mas os que me motivam, que me promovem, que me fazem ir além e acabar de encontro comigo mesma.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Cura

Discutir: do latim discutere. Debater; examinar, investigar, questionando; pôr em debate, em discussão, contestar; defender ou impugnar; travar discussão, questionar; tomar parte em discussão; questionar, contender.
Contenda: dev. de contender. Guerra, luta, combate, peleja; esforço para conseguir alguma coisa.
Discussão: do latim discussione. Ação de discutir; debate, controvérsia; polêmica; altercação, contenda, disputa.
Rancor: do latim rancore. Aversão profunda ou ressentimento amargo, não raro sopitado ou reprimido, ocasionado por algum ato alheio que causa dano material ou moral. Recordação tenaz e hostil de tais atos ou de acontecimentos análogos. Ódio.
-Aurélio (1975).

Sempre na vida iremos discordar de muitas coisas. Muitas das vezes essas coisas serão de importância vital para nosso amadurecimento enquanto outras vezes serão puras besteiras das quais um dia até mesmo teremos que abrir mão para que possamos de fato crescer de verdade, sem as amarras frouxas da futilidade.
Seja pelo o que for, discutimos.
É extremamente difícil admitir e aceitar de coração verdades que não sejam as nossas, na vida acho que não encontrei ninguém que de fato respeite o outro a ponto de não julgar nem ter que rebaixar o outro a um posto de ser não-evoluído para com isso poder "aceitar" melhor a posição contrária.
O ser humano tem falhas, uma delas é a achar que engolir e socar verdades é uma solução eficaz para os problemas.
Primeiro que discutir não é resolver, não é encontrar soluções, não é apresentar pontos plausíveis e ouvir os pontos do outro, não é recípocro - apesar de ser uma via de mão dupla.
Discutir é somente apresentar armas - alguém irá morrer.
Com o tempo aprendemos que esta não é uma solução, isto não é ao menos a busca por uma solução, é apenas uma guerra fria, não declarada, de armamento escondido - aquelas verdades que doem no peito do outro e que são faladas por pura covardia de quem discute.
Com o passar dos dias, anos e amadurecimento aprendemos a controlar os impulsos, a conter as palavras amargas, a escolher os pensamentos e, principalmente, aprendemos a deixar passar - a não guardar rancor.
Ainda assim terão vezes em que explodiremos. Aquelas vezes que desejamos nunca terem acontecido, que nos envergonhamos por termos levantado a voz - mesmo quando se teve razão, naquela hora a razão não importava, não era fator forte o suficiente para explicar um tapa, um palavrão, um olhar amargo, um grito desesperado, nada.
E dai, quando isto acontece, eu me pergunto se todo o amadurecimento valeu para algo, porque eu caio tantas vezes... E quando conseguirei somente ficar de pé, para que um dia eu possa finalmente voar?
O fato é que iremos cair tantas vezes quanto forem necessárias para aprendermos algo a mais: um pensamento melhor, uma paciência maior, para aprendermos a sorrir ao pedir perdão e ao perdoar.
Nem sempre compreenderemos. E compreender nem sempre importa.
Porque crescer é aprender que discutir não leva a nada, mesmo quando ambos estão falando baixo, quase em silêncio.
Os dias passam e um dia, numa tarde tediosa, tudo volta a ser melhor do que era.
O que realmente resolve não é argumentar, mas sim explicar e ouvir, com calma, as verdades de cada um e, em uma suplica de paz para Deus, conseguir enxergar o outro sem julgar e é também quando conseguimos ver as próprias falhas presentes naquelas nossas verdades tão potentes e intocáveis.
Saber pedoar não é esperar do outro o melhor dele mesmo, mas sim exigir de si o melhor que se pode ser para aprender a coisa mais difícil do mundo: amar só por amar, amar como a si mesmo.
Saber perdoar é se melhorar para que o outro também fique melhor.
É engolir o próprio rancor, a própria mágoa, a própria tristeza, o próprio orgulho, a própria mesquinhez, o próprio egoísmo e egocentrismo.
E como isto é difícil, exigir de si algo que talvez o outro nunca vá fazer: crescer.
E é ai que mora o segredo para a felicidade em conjunto: não exigir do outro uma responsabilidade que é individual, que é 'tua'.
Às vezes cansa, é verdade, mas vale a pena porque aprendemos também a ter paciência e paz e a vermos o momento certo para conversar, dialogar - falando e ouvindo (de verdade!).
É quando sentimos o momento certo em que nossa humildade aumentou e nosso narcisismo diminuiu e que ficamos gratos pelo outro não ter concordado, mesmo num momento de raiva ambos tendo levantado as armas, ainda assim se é grato, porque nos ferimos, mas também nos curamos.
E não há algo maior para se aprender do que a cura, a cura de si e dos demais.
Isto eu aprendi: perdoar o outro é curar a si, é livrar do próprio peito todo o mal que havia quanto às coisas rancorosas da vida... Seja as que nos faziam mal ou as que estavam em nós e faziam mal aos outros.
"Quando eu estiver contigo no fim do dia, poderás ver as minhas cicatrizes, e então saberás que eu me feri e também me curei." - Rabindranath Tagore

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Nada sei

É engraçado como a vida é.
Sentada sozinha em um bar qualquer tento escrever ao fumar e tomar uma cervejinha.
Eis que logo vejo ser uma tarefa impossível, pois homens - ah! os homens - sempre cheios de perguntas e respostas se dirigem a mim como se eles também me interessassem.
Às vezes eu me pergunto se eu sou pessimista demais a ponto de não querer que ninguém se aproxime. Bom, conversamos.
E conversando eu fui vendo como as pessoas são engraçadas.
De alguma forma eu fiquei me questionando realmente sobre quem sou eu.
Um dos caras começou a me descrever em determinado momento e foram muito bem detalhadas e bem colocadas as palavras sobre a Letícia que estava lá.
E realmente comecei a me questionar se o que eu mostrava era a Letícia que eu conheço e que deixo à mostra mesmo sabendo que os outros irão julgar - na maior parte das vezes de forma má, a excluir - ou se era a Letícia que eu finjo ser.
A falsa intelectual, a falsa auto-suficiente, a falsa alta auto-estima, a falsa que parece saber o que quer quando no mundo nunca se encontrou mais perdida.
O que mostramos afinal?
Será o tempo todo uma máscara?
Será que cheguei num daqueles momentos em que não consigo mais desgrudar os ladrilhos deste meu mosaico de mim?
Um pouco de cada, muito de tudo.
Creio que no fundo ninguém sabe, alguns adoram mentir dizendo que encontraram a verdade, a sabedoria profunda, o mistério que envolve o mundo... Revelado somente para eles.
Porque sempre têm aqueles que pensam já terem alcançado algum grau de glória, pensam que já se conhecem, pensam que sabem exatamente sobre tudo a respeito de si mesmos e, por isso, dos outros.
Pois eu sei que essas coisas todas eu jamais saberei.
Custo o que custar, terapias, estudos, vida, morte, tudo. Nada.
Eu também sei que nada sei, nem por isso ignoro o conhecimento. Pelo contrário, adoraria aprender algo.
E ai eu penso, leio, tento. Mas é tudo tão complicado.
Não somos nós afinal quem complicamos, as coisas estão tortuosas desde antes de nós nascermos. Já nascemos com os olhos distorcidos corrompidos com o comprometimento da verdade que cabe à visão de uma criança...
Tudo é verdade se cremos nisso. E nenhuma verdade é igual ou superior a outra.
Eu indago sobre quem me cobre.
Sobre quem me mostra.
Sobre quem me vive.
Sobre quem me morre.
Será mesmo eu ou o medo de ser 'mim' mesma?
Somos realmente multifacetados?
Eu fico sem chão cada vez que alguém muda de comportamento, uma hora rindo, na outra, cabisbaixo. Isso é minha perdição.
E quem sou eu para falar sobre coerência?
Um dia eu chorava e na outra hora eu dava risada. Como era bom.
Por que hoje me cobro essa constância? Essa perfeita reação de emoções que devem ter alguma razão?
Será que eu incomodei tanto os outros assim a ponto de me camuflar?
Então era tudo mentira, eu estava fingindo?
Não.
Era real.
Porque todo papel ao qual me proponho fazer ou interpretar tem sua realidade, mesmo que mais feliz ou mais amarga.
Eu só não sei o que fazer ao não me permitir mostrar a minha real cara quando muitos mostram a verdadeira face, mesmo quando tentam esconder.
Constantemente censurada.
Talvez este seja meu dever, tirar os ladrilhos que os outros me impõem de como eu devo ser, falar, andar, me comportar...
Quando dizer 'sim', quando dizer 'não', quando dizer 'oi', quando dizer 'tchau'.
É engraçada a reação dos outros quando somos por um segundo verdadeiros.
Talvez alguns prefiram que a gente finja, talvez alguns prefiram que a gente atue.
Talvez alguns ainda não saibam lidar com a espontaneidade alheia.
Ou talvez eu ainda seja imatura demais para compreender o jogo que os outros fizeram com a própria vida...
Talvez, quem sabe...
Eu nada sei.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Mim...

Hoje procurei palavras sobre as quais escrever, e após uma bela noite de companhia alegre e inspiradora, ainda assim foram palavras estranhas as quais encontrei.
De repente me peguei assim, pensando naquilo que um dia fui.
Certa vez, quando eu era mais nova, eu me dava o luxo e dava aos outros a simplicidade de não julgá-los.
Hoje eu me irrito com tamanha facilidade que às vezes até eu me estranho.
Fato é que um dia, após os meus 15 anos, um moço me estuprou e muitos outros tentaram me agarrar.
Na época não culpei ninguém. Creio que certas coisas ficam mais fáceis se simplesmente as deixamos passar. Mas hoje, justo agora, me peguei pensando e ponderando se eu realmente era melhor do que sou hoje.
Um dia, quando nova, se um homem me agarrasse eu o empurrava, mas continuava a ser sua amiga, eu continuava a mesma, sem raiva, sem ressentimentos, mostrando o meu lugar e o devidíssimo lugar do mesmo!
A partir dali eles me respeitavam, ou ficavam com medo, ou simplesmente desistiam, vai saber. O caso é que eles não mais me atormentavam e eu podia passar ainda horas agradáveis ao seu lado.
Eu simplesmente vivia numa bolha onde quem quer que a tentasse furar não era mal visto, eu quase compreendia.
Então fico me perguntando se eu era ingênua. Se talvez eu tivesse que nunca mais ter falado com eles nem nada disso. Eu sei que em um caso específico sim, era caso de polícia, mas eu era fraca e ninguém (nunca) conversou comigo sobre sexo e outras coisas mais que a vida se encarrega de ensinar depois de muitos tapas, então eu permanecia imóvel, sendo estuprada, noite após noite, sem reclamar, sem falar nada.
É claro que o absurdo mesmo só foi uma noite, mas o suficiente pr'eu nunca mais querer lembrar.
Depois disso me fechei, me envolvi com quem não deveria, mas tudo o que eu queria era só um pouco de amor. E ao que me constava carência nunca havia sido pecado.
Nisto eu fui ingênua, eu sei. Talvez eu seja ainda .
E anos depois me encontro aqui, um pouco mais ranzinza e me questionando se talvez a vida que eu levava e a forma como eu via os outros era mais branda, mais leve, mais alguma coisa de melhor...
Talvez eu tivesse o dom de saber perdoar.
Talvez eu soubesse que no final não adianta ficar culpando o mundo por todas as coisas ruins que acontecem com você, afinal, temos que crescer e aprender a nos defendermos da maneira como dá.
Mas ainda assim eu sinto saudades daquele tempo em que quase nada me tirava da minha sobriedade de quem sabe o que quer, de quem não tinha medo de se perder, de quem já havia se perdido e que simplesmente não descontava no mundo as burradas que havia feito.
Sinto falta daquela menina que um dia não culpou ninguém, que tentou sentir raiva, tentou julgar, tentou maldizer, mas tudo o que lhe ocorria era que Deus tudo vê e que um dia isso teria um propósito, que eu sabia que ninguém além de mim poderia me ferir e que ninguém além de mim poderia me fazer feliz.
Sinto falta dessas coisas todas, que hoje não sei se era ingenuidade ou sabedoria.
Sinto falta...
Porque hoje tudo o que me toca me faz mais e mais ranzinza.
Sinto falta de mim mesma e de quem eu fui um dia...

sábado, 27 de novembro de 2010

Cheiro de casa...

Parar diante daqueles dois portões de ferro faz meu peito gelar toda vez. Por um momento penso em como deve estar tudo dentro daquele mundo que permanece cindido da minha realidade. Quando a primeira fresta se abre percebo a agitação, aqueles milhares de cachorros, a grama aparada, as árvores. Ao fundo vejo a casa em que passei boa parte dos meus melhores momentos, e mais ao fundo a churrasqueira...
Naquele momento sinto como se tivesse certeza de que tudo pode estar ruim, mas vai melhorar. Talvez seja isso mesmo que casa, no sentido de lar, significa pra mim. O lugar que me dá a certeza de que tudo vai ficar bem, e de fato fica.
Acendo a churrasqueira, atendo o telefone, chegam os amigos, um após o outro, abrem-se as garrafas de cerveja que aos poucos vão se empilhando em cima da pia. A carne fica pronta, assim como a saudade que esta no ponto para ser servida, e divida entre todos. Compartilhamos da falta que uns fazem na vida dos outros, assim como dividimos uma Brahma gelada.
E a noite vem, acende o céu, mostrando como é bonito estar longe do tumulto da cidade, perto de quem se quer bem. As risadas se multiplicam, a alegria pede passagem aos problemas... Relembramos os outros encontros, os tempos de loucura, os amores do passado, e celebramos a vida que cada um escolheu. Cada um com o seu caminho, mas nunca esquecendo dos amigos que fez antes das encruzilhadas...
Alguém liga o som, e apesar das diferenças de gosto musical todo mundo se entende. Um faz beicinho, outro torce o nariz, mas o álcool faz o papel de socializar, e leva todo mundo pro mesmo lugar: A piscina.
Completa-se mais um ciclo, mais um dia em que me senti feliz e abençoado.
Vão indo embora, um a um. E a cada abraço de despedida eu sinto um único cheiro, o cheiro de casa...

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

É tempo...

É tempo de despedida, e a gente vai ficando assim, sem saber o que falar, sem saber o que fazer, para onde ir, como seguir em frente, mas com a certeza de que algo melhor nos aguarda.
É tempo de partida, cada um segue seu rumo em direção ao caminho que escolheu, ou em direção a outro totalmente diferente do pretendido inicialmente. Não importa, é hora de pegar as coisas e ir embora.
Sempre me questionei se essas horas de desembarque são realmente as certas, creio que nada seja acaso, nem tempo errado - apenas tempos que deixam de ser aproveitados, muitas vezes.
E ai colocamos na balança tudo o que foi feito - as brigas, os amores, os amigos, as conversas, as lembranças que ficam de algo que começou de um jeito totalmente diferente do que agora é quando terminado.
Seguir em frente, continuar as passadas largas rumo aos objetivos que traçamos para a nossa vida, isto é realmente difícil. Alguns com portas já escancaradas, outro tendo que entrar aos murros... A justiça é falha, mas o aprendizado nunca é tardio se visto com os olhos de quem quer aprender.
E crescemos, crescemos por imposição, por passar do tempo, por cobranças, por ensinamentos, por pessoas... Aumentamos, nos esticamos, engordamos em conhecimento e alargamos as medidas inexatas de uma vida feliz.
Inexatidão, palavra que supera a mágoa. Supera porque sempre ficamos com aquela sensação de que poderia ter sido, quem sabe, diferente, melhor ou pior, mais proveitoso, mais sábio nas horas de imaturidade, e pela dúvida de se o futuro realmente reserva algo de bom para cada um de nós.
Não acredito em destino, por isso comemoro cada dia como se fosse o último.
Meus dias ranzinzas são aqueles que deixo passar com facilidade, e muitas vezes quando outros me vêem triste é porque eu amo tanto o presente, a vida, esta divina dádiva, que me prendo aos detalhes, na observação das horas latentes que guardam tanta coisa que poucos realmente conseguem ver.
Às vezes meu desejo é só morrer, entrar em coma para sentir menos, amar menos, crer menos, e quem sabe com isso aprender mais... Conseguir assimilar tudo.
Meu olho é como máquina fotográfica, recordo-me de minúcias que muitos se surpreendem ao me ver contar - lembro-me de dias, lembro-me das pessoas, lembro-me dos momentos mesmo sabendo que muitos nem mesmo lembram-se mais de mim, ou sabendo que um dia deixarão de lembrar.
Mas nada exclui meu presente.
Eu me sinto extremamente viva, e esta é minha maior dor: ver o segundo passar.
Aprendi a ver na vida as oportunidades que me são dadas e aquelas que são negadas com a mesma clareza como se vê sol mesmo em noite de lua clara - está lá, iluminando através de outros seres.
São poucas as pessoas que realmente poderemos chamar de 'amigos' pela vida - e sou grata por aqueles que assim denomino, bem como sou grata por aqueles que assim me denominam.
A gente cresce. Vira gente grande. Um dia menino, no outro homem. Nos tornamos mais seres humanos - no real sentido da palavra. Alguns se desviam, mas isso é inevitável, sempre haverá as exceções ao que deveria ser a regra.
Conquistamos nossa própria liberdade. E com o tempo vemos que a maior libertação de todas é aquela que permitimos a nós mesmos.
Eu adoro gritar, falar alto, brincar, me soltar - feito criança. Rir de mim mesma se transformou em terapia.
Mas como é difícil rir quando todos os outros riem junto!
Até que um dia, assim do nada, numa viagem ou numa manhã dentro da sala, a gente se solta, se desprende, se desdobra, se redescobre, se dá novas oportunidades, novas asas, novas lágrimas, novas vozes...
E também sem mais nem menos passamos a ver os outros com outros olhos, com outro peso, sem erguer a mão, estendendo as palmas, mirando nos olhos, chorando junto, brindando no pátio, se despedindo sem ter tido a paciência e maturidade de ter sabido dar um simples 'oi'.
Eu me arrependo, do que fiz e do que não fiz.
Deixar de lado suas próprias chagas é uma das tarefas mais árduas que se tem que aprender. O egoísmo, o egocentrismo, a própria insuficiência ao se achar melhor ou pior do que os outros, porque às vezes a muralha que há ao redor de alguém é apenas reflexo da deficiência de amor próprio e das dificuldades enfrentadas.
Como somos cegos, mesquinhos e idiotas.
Hoje eu me arrependo de ter sido tudo isso muitas vezes na vida.
Talvez ainda seja um pouco, mas com muito menos peso do que antes.
Melhorar-se, dedicar-se, superar a si mesmo - as dificuldades aproximam as pessoas.
E em meio a tanto contratempo, a tantas amizades, a tanta experiência encontramos aquela pessoa que mais deveríamos ter cativado desde o início - o Eu.
É tempo de despedida, e eu vou indo com uma sensação de quem ainda tinha algo para falar, para ensinar, para aprender... E espero um dia realmente poder fazer tudo o que eu gostaria sem esperar o tempo passar e o trem parar onde tenho que descer...
É tempo de arrumar as malas, lavar os pratos, guardar as virtudes, jogar fora os defeitos e aumentar as qualidades. É hora de aprender a ser si mesmo sozinho pelo mundo. Alguns já sem pais, outros ainda dentro de casa. Não importa, é hora de se despedir do velho Eu.
Depois de um crescimento não há volta, não tem como escapar das responsabilidades que a sabedoria acarreta, mas é muito bom saber que os tempos mudaram e que eu sou outra, porque no fundo no fundo eu deveria ter sempre sido eu mesma, sem medo, sem ressentimento, sem olhares duros, sem medir os gritos de 'uhul' em sala de aula.
Para sempre ecoarão as canções mal cantadas, os sorrisos e risos das piadas bobas ou bem contadas, a ajuda vinda quando mais era preciso.
Porque no final não eram as notas o que mais importava, mas o quanto nos tornamos mais próximos de sermos nós mesmos pelo caminho tortuoso que traçamos juntos rumo à direção de nossa própria estrada.
Cada um com sua bagagem, cada um com sua história, cada um consigo mesmo levando os outros na memória e abrindo espaço para coisas novas sabendo que há tempos de encontros e de partidas, de inícios e de chegadas, de derrotas e de vitórias até que a morte nos leve e nos encontremos em outras vidas...
É tempo de despedidas... É hora de ir embora...

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Intensidade

Dizem que procuramos pessoas com a mesma energia que a nossa, aquela coisa toda sobre o campo vibracional e o sentir-se próximo de quem é parecido com a gente. Bom, creio que de fato seja verdade.
Se olharmos para as pessoas que tivemos pela vida, que andaram ao nosso lado ontem, hoje ou as que sabemos que estarão lá amanhã, veremos que elas são reflexos do que éramos, somos ou procuramos ser na vida.
Como espelhos.
Eu mesma criei um termo - eu e meus neologismos - chamado "almístico": coisas que vêm da alma. Assim eu posso dizer que as pessoas são 'espelhos almísticos', elas refletem aquilo que temos dentro e que sabemos quando acordados ou que está adormecido e queremos que acorde - mesmo quando esse desejo é inconsciente.
Procuramos aqueles que nos serão de ajuda para mais ou para menos.
Então, se observarmos, há sempre aqueles fatores de qualidade ou de defeitos que queremos melhorar.
Tem gente que culpa o destino por só se envolver com gente cafajeste, o fato é que procuramos essas pessoas não porque somos cafajestes nem queremos ser com alguém, mas porque isso irá acrescentar algo em algum momento, seja para se aprender a ser melhor consigo mesmo ou com os outros - e afinal, quem disse que só um segundo ou terceiro é que pode nos sacanear? A gente também se sabota!
Mas deixando de lado a sabotagem, o fato é que nos identificamos com aquilo que desejamos e necessitamos em nosso interior.
Aquela velha sobre "me diga com quem andas e te direi quem és" nem sempre é verdade, porque julgamos os outros precipitadamente.
O fato é que creio que temos as melhores ferramentas dentro de nós mesmos. Ninguém nos ajuda melhor do que o próprio "acordar para dentro". Os outros - amigos, parentes, amores - são também de grande responsabilidade sobre o que acontece em nossa vida, mas só se deixarmos que eles nos influenciem, ataquem, agridam, elogiem, acariciem e assim por diante.
Então quando alguém se sentir esgotado e sem forças, saiba que a maior arma contra isto está dentro de si mesmo.
É engraçado quando alguém me procura atrás de um sorriso, de palavras, textos, ou como disse um amigo meu: intensidade... Penso ser engraçado porque é justamente isso o que os outros são para mim - minha inspiração, a continuação da minha luz, a alegria que cativei e que foi cativada por eles também.
Procuramos os outros para nos lembrarmos do melhor de nós mesmos, e é uma pena às vezes - muitas vezes - nos esquecermos da nossa capacidade de realizar, de ser maior, de superar.
Então vem alguém e nos dá a mão e este gesto é um alívio.
Algumas nem mesmo sabem que estão ajudando, algumas buscam ajudar a vida toda.
O campo vibracional do outro altera o da gente e, sabendo disso - de uma forma ou de outra -, procuramos ficar perto daqueles que têm a energia que ansiamos no momento, no dia ou no fim de noite.
Disso eu sei e é verdade, boa energia não depende de distância, de grau de parentesco nem de falta de adversidade, ela simplesmente é trocada, é buscada, é querida por aqueles que sabem encontrá-la em algum lugar.
E o maravilhoso da vida é isto, ver que mesmo tanto tempo fora, tanto tempo longe, tanto tempo em silêncio, ainda assim, as pessoas podem te sentir e saber que sempre que precisar podem contar com teus pensamentos, sentimentos, palavras - porque tudo isso está conectado ao vibracional.
Eu tenho amigos e eu os sinto de longe, de outra cidade, de outros países...
E cada vez mais eu sei que eles também podem me sentir.
É como viajar sem tempo, sem estrada, sem retornos - é um doar-se em direção do que se acredita, é acreditar em si e com isso ajudar os outros a acreditar neles mesmos.
Mesmo quando cair, mesmo quando falhar, mesmo quando for difícil como nunca antes saberei que em algum lugar escondido no recanto de minha alma está a força que preciso para seguir em frente, pois eu tenho espelhos almísticos, e esses, ah! esses são pequenos pedaços de minh'alma que longe de mim me representam na saúde e na doença, na alegria e na tristeza, os verdadeiros casamentos das forças ocultas que tenho e devo sempre me lembrar de carregar - até que a morte me leve embora... Mas sem que eu me separe de mim mesma.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Pratos Limpos!

Se tem algo na vida que eu detesto é gente fingida, gente que joga, que mente, que disfarça, que omite, que engana, que faz tudo para sujar os pratos e escondê-los por sob a louça aparentemente limpa que ainda sobra de qualquer relação.
Esse tipo de gente é o que mais tem; como reconhecer? É aquela que liga não pra ouvir tua voz, mas pra saber quem está com você, que transa só para fazer apaixonar sem querer amor, que diz ser amigo só para descobrir seus segredos mais íntimos e contar para todos ou usar todos contra você quando mais se está vulnerável... é aquele tipo de gente que nunca conversa sobre si, e se fala diz pouco, insinua, aparece só para marcar território, só para dizer que está ali sem estar presente, que só faz sem nem fazer questão.
Sinceramente já conheci muita gente assim, e por incrível que pareça cada vez mais me vejo longe desse tipinho raso de personalidade fraca, fútil e mesquinha.
Claro que sempre sobra um ou outro pelo caminho, aqueles que a gente custa muito para ver, mas um dia vê, ah! se vê!
É como uma daquelas manhãs ensolaradas em que você se dá conta de que o mundo é melhor sem a presença daquela pessoa, ou que ela nem faz falta.
Pessoas que não fazem falta, essas simplesmente são assim.
Fazem de tudo para conseguir sugar algo do outro, às vezes até sem razão para tal.
Eu conheço uma pessoa que, por exemplo, ficou um ano com um cara que só a enrolou. Enrolou, sumia, desaparecia sem dar a menor satisfação.
Ok, sem cobranças, mas sumir por 1, 2, 3 meses já é demais!
Não se interessar, não se importar.
E ainda há quem diga que esses sumiços são justamente os indícios de que é o melhor para os dois, que só assim é possível continuar.
Oras, como crescer regando uma flor somente 4 vezes ao ano?
As folhas tornam-se espinhos e o coração fica assim, como diz na canção un "corazón espinado" com os resquícios do que esperaria de um amor.
E não digo amor desses para uma vida toda, mas de amar o outro pela pessoa que se é, pelo respeito, carinho, aproximação que se tem. O amor do ser humano, aquele que se troca por pura paz de espírito.
O caso é que infelizmente tem muita gente que acoberta a sujeira com sorrisos, ligações de última hora, flores, chocolates, abraços falsos - daqueles fraquinhos com tapinha nas costas...
A melhor coisa da vida são as palavras e os olhares.
Isso porque a conseqüência para aqueles que sabem usá-los é ter os pratos limpos!
Uma cozinha bem arrumada é reflexo de um relacionamento inteiro.
Claro que a opção é de cada um, mas eu realmente admiro aqueles que sabem a hora de sentar e conversar, falar, ouvir e raciocinar junto da gente tudo o que se passa. Essas pessoas que são realmente amigas, que te abraçam enquanto você chora, que te ligam quando você menos espera - mas sempre ligam, que aparecem só para saber como você está só porque sentiu saudades naquele dia...
Essas pessoas que a gente sente na voz a sinceridade, vê nos olhos o brilho da sua presença para elas e capta no sorriso o reflexo da sua alegria por também encontrá-las, seja para dar uma volta de carro, seja para sentar num café e conversar, seja para beijar e matar as saudades, seja para chorar e fazer as pazes...
Esses seres são aqueles que hoje eu cativo e cultivo, porque não quero mais pratos sujos...
Em casa sou eu quem lavo a louça de domingo, mas uma coisa eu sei, sempre que precisar eu irei lavar, mesmo a contra-gosto, porque não há satisfação maior do que deixar claro aquilo que poderia ficar subentendido e com isso conseguir fazer escolhas, entender, saber para onde se vai, de onde se veio... E uma vez ou outra quebrar alguns copos...
Mas sempre ir embora com a sensação de dever cumprido, de relação reafirmada, ou de coração quebrado, mas sabendo a razão, os motivos e as expectativas daquela situação, e sempre tendo muito sabão em mãos para conseguir sempre - Sempre – diluir a gordura e seguir em frente - sozinho ou acompanhado!

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Conselho...

Ontem um brother meu veio falar comigo...
Nada fora do comum, problemas amorosos. Vamos aos fatos sem dar nome aos bois... Esse meu amigo namorou uma menina durante 2 anos, ele sempre falou pra todo mundo que curtia ela, que queria casar com ela, e tudo mais. Tudo ia bem, mas não deu certo por motivos que não convém aqui explicar.
- Cara, eu penso em voltar com ela...
- Mas véio, já tá fazendo um tempo que vocês terminaram, né?
- Ah, pra mais de mês...
- E você pensa em voltar com ela, por quê?
- Ah, foda...
- Ela tem alguma qualidade que você admira?
- Ela tinha várias, mas agora não enxergo mais nenhuma não
- Vai lá, tenta pensar! Além dos três orifícios, ela tem algo a mais que te chama atenção, que te faz crer que ela é uma mulher melhor que as demais?
- Não...
- KKKKKKK... Então meu brother, por experiência própria é melhor nem tentar. Quando você consegue resumir uma mulher a três buracos, ela não é pra você...
- Cara, você tem razão. Não vejo mais nada nela que seja qualidade essencial, não aprendo com ela, não me melhorava em nada estar ao lado dela, só me sugava...
Terminada a sessão terapia grátis voltei pra casa pensando, eu mesmo já estive na situação desse amigo por diversas vezes, e é mais fácil enxergar tudo quando estamos vendo aquilo de fora. De qualquer maneira, por mais que sejamos incapazes de ver o macro da situação, fazemos a transição de desapego do outro, embora de forma mais demorada. Por isso é importante conseguir enxergar o que aquela pessoa te acrescentava para que fizesse por merecer estar na sua vida.
Meu conselho de verdade pra quem teve um fim é: O que essa pessoa tem de qualidade que te interessa?
As vezes o conselho vem só pra ratificar aquilo que tá pregado na nossa cara, e que muitas vezes temos dificuldade de assumir por medo! Medo de um monte de coisa, de desapegar, de ficar só, de estarmos sob nossa única e exclusiva responsabilidade, e até mesmo de não saber pra que rumo levar a vida...  Medo de coisas que são essenciais para que possamos permanecer levantados pelas nossas próprias pernas, ou seja devem ser resolvidos a todo custo, pois a vida exige, e será cruel na hora de cobrar!
Nem tudo pode ser resolvido na hora, mas as vezes na hora tudo parece ser resolvido por conselho...

Apaixonar, gostar, amar...

E afinal, quais são as regras do amor, do gostar, do se apaixonar, do “dar certo”?
É estranho como todos sempre têm suas teorias sobre como fazer um relacionamento funcionar – as mulheres sempre fazendo coleção sobre como deixar os homens aos seus pés e vice-e-versa.
O fato é que não importa, ninguém sabe colocar em prática aquilo que prega, e a verdade é que nem sempre dá certo pelo simples fato de que nos assuntos do coração não há um caminho certo ou errado para se seguir.
O que acontece é que as pessoas têm problemas, e acabam levando esses problemas para o outro, sendo que deveriam Se trabalhar – psicologicamente – antes de falarem que não deu certo porque ‘isso’ ou porque ‘aquilo’. Simplesmente não durou porque as cabeças não batiam, as idéias não se encontravam, as teorias se divergiam e os dois andavam não ao lado, mas distantes um do outro.
O medo, o temor, a insegurança, a falta de si mesmo, tudo dentro de si, ou dentro do outro.
Vacilamos ao ouvir e tentar nos limitarmos a teorias cujas práticas não estão à venda no mercado. Porque se alguém tivesse o segredo do amor, venderia, podem ter certeza, afinal, daria muito lucro.
Eu sempre escuto aqueles conselhos básicos e arcaicos: não pode falar muito, não pode ligar, não pode procurar, não pode falar que gosta, não pode demonstrar insegurança, não pode demonstrar os sentimentos de medo, não pode falar sobre o passado, não pode transar nos primeiros encontros, não pode quase nada, como se tivéssemos que esperar o outro fazer tudo para depois nos doarmos.
O amor não é isso, amor é via de mão dupla, para recebermos devemos trocar – e eu digo troca porque amor não se dá, já que não é posse, não é meu ou dele, mas sim em direção a mim ou ao outro.
Não quero discutir se existe ou não amor, respeito os que acreditam que isso seja utopia, mas eu creio que há e por isso penso a respeito e redijo tais pensamentos. Crer ou não não é a questão.
Outra coisa que sempre falam é o “não pode ir rápido demais”. E eu sempre fico me perguntando o que seria esse rápido demais, se é uma forma de os outros procurarem nos proteger ou proteger a si mesmos ao evitarem ter uma desilusão com algo passageiro.
De fato devemos ter cautela, mas também temos que pular – pular de olhos e asas abertas. O problema é que as pessoas simplesmente se esqueceram do que é voar.
Creio que não exista rápido demais, porque quem está andando ao lado da gente é que deve acompanhar o nosso passo, assim como nós acompanhá-lo (o passo do outro). E as pessoas sempre ficam olhando e achando que estamos correndo ou indo devagar demais.
No final das contas não importa se estamos muito à frente ou muito atrás, desde estejamos acompanhados de quem realmente nos ajuda a continuar em nosso caminho.
Disto eu sei, e não tenho mais medo.
Então da próxima vez em que alguém disser que as coisas estão em uma velocidade assim ou assado, não dê ouvidos. Cada um sabe de si, e cada um sabe o que é melhor para si.
É bom que se preocupem com a gente, mas no amor – gostar – se apaixonar - não há regras, infelizmente o que há muito são pessoas frustradas tentando se realizar e encontrar pelo meio da vida alguém que dê certo, custe o que custar...
E esses conselhos, teorias, palpites podem custar muito caro, muito caro mesmo quando se deixa de pular e dar a cara a tapa para o mundo quando mais vale a pena, quando mais devemos nos entregar, quando deveríamos ouvir nós mesmos e ao invés disso tudo nos travamos porque acreditamos que há, em algum momento, uma regra para se saber amar melhor, sendo que não há...
Basta ser você mesmo.
E isto, ao outro, também deve bastar.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Triste, muito triste...

Primeiramente queria pedir desculpas por postar algo que não tem tanto a temática do blog, mas acho que devemos ter ao menos noção do que é o sistema de saúde do nosso país, e da atitude desrespeitosa de alguns profissionais para com a vida humana.
Abaixo está a carta de um médico intervencionista que foi responsável pelo transporte de uma menina de 8 anos, e encontrou uma série de problemas pelo caminho, sendo um desses os seus próprios colegas de profissão.
É triste, muito triste que as coisas ainda sejam dessa forma...

Nota: "ambuzar" é um termo utilizado pelos médicos para designar a ventilação manual feita com o ambú, uma espécia de balão de borracha que se aperta para que ocorra a insuflação dos pulmões do paciente.


Salvador, 24 de agosto de 2010,

Inicialmente quero dizer que não acredito, acreditem, que este texto possa mudar qualquer das barbaridades que vivenciei nessa madrugada. Acreditem, não acredito que encontrarei eco em algum lugar. Preciso, entretanto, falar.
Por volta de 22h30min da última segunda-feira, 23 de agosto de 2010, fui contactado pela Central Estadual de Regulação (CER) para realização do transporte da menor, Ana Larissa Menezes Baptista. Ao me dirigir à mesa do chefe do plantão para pegar a ficha de atendimento para o transporte inter-hospitalar fui informado que deveria transportar a paciente supracitada do Hospital São Jorge (HSJ) para o Hospital Geral Roberto Santos (HGRS) para a realização de tomografia computadorizada (TC) de crânio.
A história que ouvi era a de uma paciente em estado grave, no pronto atendimento (PA) do HSJ, em ventilação mecânica (VM), usando adrenalina e dobutamina, após ter sido reanimada ao dar entrada naquela unidade por volta das 18h. Como de costume, solicitei ao chefe de plantão – Dr. Jisomar - e à médica que fora responsável pela regulação, cujo nome me foge nesse momento, que mantivessem contato com o chefe de plantão da emergência do HGRS naquele dia – Dr. Raimundo – ratificando o quadro clínico da paciente e solicitando ao mesmo que verificasse as condições da sala da TC a fim de que a transferência fosse feita no menor tempo possível e Ana Larissa não fosse exposta a qualquer entrave que prejudicasse ainda mais o seu quadro que, naquele momento, já era grave.

Informei ainda ao Dr. Jisomar que não realizaria o exame caso o HGRS não possuísse um ventilador disponível na sala de bioimagem ao qual a paciente pudesse ser conectada. Informei ao mesmo que muitos coordenadores do HGRS tinham o hábito de autorizar a regulação de pacientes em VM para a realização de TC sem ao menos confirmarem a existência de ventilador na bioimagem. Informei ainda que por diversas vezes "ambuzei" pacientes que precisavam realizar TC em respeito aos mesmos, bem como aos seus familiares. Disse-lhe ainda que por diversas vezes, sensibilizado com o quadro, e com a necessidade dos pacientes, aceitei fazê-lo, mas que não estava disposto a novamente solucionar um problema que deveria ser resolvido antes da regulação. Dr. Jisomar informou-me que Dr. Raimundo sabia do quadro da paciente, mas que tentaria manter novo contato e que ratificaria o meu pedido.

Em virtude da gravidade do quadro de Ana Larissa resolvi sair da base da CER para realizar o transporte o quanto antes. Ao chegar ao HSJ fui recebido por Dra. Danielle Souza, CREMEB 20.733, pediatra de plantão, que relatou a história de Ana Larissa. Segundo ela, a paciente há cerca de uma semana havia sido atendida numa emergência após episódio de vômito, febre e cefaléia. Naquela oportunidade, a paciente foi submetida à punção liquórica que descartou meningite. Após remissão do quadro na emergência, a menina recebeu alta e evoluiu em casa por quase cinco dias assintomática. Naquela manhã, 23 de agosto, entretanto, Ana Larissa demorou a acordar, fato que chamou a atenção dos seus familiares.

No meio da tarde a menina apresentou crise convulsiva e rebaixamento do sensório sendo levada ao Hospital Menandro de Farias (HMF). Após ser atendida naquele hospital, Ana Larissa foi encaminhada para o Hospital Couto Maia (HCM) em ambulância convencional, acompanhada pela mãe e por uma técnica de enfermagem. Segundo Dra Danielle, a mãe relatou que no caminho Ana Larissa apresentou piora do estado geral, com cianose central e ausência de "reflexos". O motorista da ambulância resolveu então parar no hospital mais próximo, tendo chegado ao HSJ. Ao dar entrada na unidade, a menina apresentava de fato cianose central e ausência de batimentos cardíacos.

Foi, então, reanimada com adrenalina e massagem cardíaca e submetida à intubação orotraqueal. Desde então, a paciente encontrava-se em uso de Adrenalina (0,5) 1ml/h e Dobutamina (5) 1,5 ml/h e em ventilação mecânica. Naquele momento, Ana Larissa apresentava Glasgow 3, midríase paralítica bilateral, freqüência cardíaca (FC): 165bpm, pressão arterial (PA): 104X41 (62 mmHg), oximetria de pulso indicando SpO2: 99%, em VM, com PEEP: 5/ PI: 15/ FAP: 22 e FiO2: 60%. Preparamos a paciente para o transporte e nos dirigimos ao HGRS. Todo o transporte até o HGRS transcorreu sem qualquer intercorrência. Fomos acompanhados por Dona Silvia, mãe de Ana Larissa.

Ao chegar à porta da emergência pediátrica solicitei à enfermeira que me acompanhava, Lidysi, que verificasse na sala da TC se tudo estava preparado para a realização do exame, conforme combinado, para que só assim eu pudesse descer da ambulância com Ana Larissa. Após retornar da bioimagem, Lidysi informou-me que não existia ventilador preparado e que a técnica de radiologia nem mesmo sabia que esse exame seria realizado. Resolvi, então, descer da ambulância com Ana Larissa para realizar o exame, mais uma vez em respeito à sua mãe que chorava e rogava a Deus pela melhora de sua filha e por ela - uma menina de oito anos que até a manhã daquele 23 de agosto de 2010 era apenas uma menina saudável e feliz. Entrei, então, na sala de TC e pedi a técnica de radiologia que fizesse o exame no menor tempo possível.

Informei-lhe que aquela paciente estava regulada, que Dr. Raimundo estava ciente da necessidade da realização do exame e que assim que terminássemos o mesmo eu retornaria à ambulância, conectaria Ana Larissa ao ventilador da UTI móvel da CER e solicitaria aos médicos de plantão que fizessem a solicitação da TC de crânio a fim de que o filme pudesse ser liberado. Após compreensão da técnica de radiologia, vesti uma capa protetora de chumbo e "ambuzei" por cerca de 5 minutos Ana Larissa dentro da sala da bioimagem, durante a realização da TC. Após retornar à ambulância, solicitei a Lidysi que informasse à pediatra de plantão do caso que já estava regulado e que pedisse a ela para ir até a ambulância conversar comigo, visto que eu assistia Ana Larissa e que a mesma encontrava-se em VM, necessitando, pois, de um ventilador e em uso de Adrenalina e Dobutamina em bombas de infusão, as quais não deveriam ficar muito tempo fora das tomadas para não descarregar.

Caso fosse impossível a vinda da mesma à ambulância, que ela fizesse então a solicitação da TC de crânio para que pudéssemos ter acesso ao filme impresso. A médica, Dra. Antonia Aleluia – pediatra de plantão -, resolveu então apenas solicitar a TC de crânio. Lidysi foi então ao setor de bioimagem e recebeu o filme da TC de crânio de Ana Larissa após entregar a solicitação do exame. Ao retornar à ambulância com a TC de crânio identifiquei um acidente vascular cerebral hemorrágico (AVCH) extenso, com sinais de sangramento intraventricular. Pedi novamente à enfermeira que mantivesse contato com Dra. Antonia Aleluia e que solicitasse a ela um encaminhamento para avaliação neurocirúrgica, visto que eu havia identificado um AVCH extenso.

Dra. Antonia informou a Lidysi que não faria qualquer solicitação visto que a paciente deveria ter sido regulada com tal pedido. Ora, tínhamos uma paciente com um AVCH extenso dentro do HGRS e ela não seria avaliada por um neurocirurgião porque no seu pedido de regulação não havia essa solicitação? Para quê então precisávamos da TC de crânio, se não para direcionar, os nossos próximos passos? Precisaríamos então prever que Ana Larissa tinha indicação neurocirúrgica para só assim levá-la ao HGRS? Essas foram questões colocadas por mim para a plantonista supracitada a fim de sensibilizá-la para o que estava acontecendo ali, tudo sem qualquer efeito. Direcionei-me então por conta própria à emergência do HGRS, atrás de algum neurologista que desse o direcionamento adequado à Ana Larissa. Encontrei, então, Dra. Miriam Sepúlveda, CREMEB 3784, neurologista de plantão do HGRS. Mostrei a ela a TC de crânio e a mesma informou se tratar de um AVCH.

Disse-me que a paciente precisava de uma vaga em UTI pediátrica e de avaliação neurocirúrgica. Questionei a ela sobre a possibilidade de Ana Larissa ser admitida e ela me informou não ser a responsável por resolver essa questão. Disse-me que mantivesse contato com Dr. Raimundo ou Dra. Paula (coordenadora da emergência pediátrica, segundo ela). Mantive contato com Dr. Jisomar para colocá-lo a par do que ocorria e ele me pediu que aguardasse até que conseguisse falar com Dr. Raimundo. Paralelo ao tempo que aguardava o contato mencionado, procurei por Dr. Raimundo na sala da coordenação médica do HGRS, sem sucesso. Encontrei-o, entretanto, na sala de repouso da equipe médica. Coloquei-o a par de tudo que acontecia e da necessidade de avaliação neurocirúrgica da paciente. O mesmo informou-me que esse não era o acordado com a CER e que eu deveria procurar a plantonista da pediatria para saber se seria possível aceitar Ana Larissa naquela unidade. Lembrei a ele, porque imaginei que ele tivesse esquecido, que aquele era um hospital de referência para avaliação neurocirúrgica. Ainda assim, Dr. Raimundo me disse que fosse à emergência pediátrica resolver com quem estivesse de plantão por lá o que seria feito.

Entrei em contato com Dr. Jisomar que me orientou a de fato permanecer com Ana Larissa no HGRS. Ele me orientou a informar à plantonista que Ana Larissa ficaria no hospital, a procurar um ponto de oxigênio dentro do PA do HGRS e disse-me que se fosse preciso montasse o ventilador da UTI móvel no PA da pediatria do HGRS. Procurei então a pediatra do plantão, Dra. Antonia Aleluia, mas não a encontrei dentro do PA. Consegui apenas falar com Juliana, enfermeira que estava de plantão naquela unidade, e pedi a ela que mantivesse contato com Dra. Antonia informando-a das orientações que eu havia recebido. Juliana me informou que falaria com Dra Antonia e que ela me encontraria na entrada do PA.

Fui então à ambulância retirar Ana Larissa. Descemos com toda monitorização que fazíamos – monitor Dixtal, torpedo de oxigênio, ambu, oxímetro, cardioscópio e manguito de PA não invasiva, bem como com duas bombas de infusão para adrenalina e dobutamina. Encontramos com Dra. Antonia na porta da emergência pediátrica. A partir dali, seguiu-se um show de horrores que foi iniciado por Dra. Antonia e seguido por Dra. Heloísa, uma segunda plantonista com a qual, poucos minutos mais tarde, eu tive a infelicidade de cruzar. Dra. Antonia, se posicionando na porta de entrada da emergência, me disse de maneira ostensiva, e num tom inapropriado para a situação, que não tinha lugar para aquela paciente ali. Disse-me ainda que eu enganava os familiares de Ana Larissa e que ali eles não fariam nada por ela. Disse-me que sairia do plantão e o deixaria sob minha responsabilidade.

Eu a informei que havia sido orientado que Ana Larissa deveria permanecer no HGRS. Após se retirar da porta, fato que impedia minha passagem, entrei no HGRS. Direcionei-me à sala de reanimação, onde existiam dois ventiladores mecânicos que não estavam sendo utilizados, para então instalar Ana Larissa. Nesse momento, fui então surpreendido por Dra. Heloísa Cunha que aos gritos insultou-me. Dizia ela que eu estava acostumado a chegar naquela unidade e deixar os pacientes por lá, mesmo sem que fosse possível recebê-los.

Dizia, ainda, que eu havia sido expulso daquela unidade há alguns dias por um neurocirurgião. Eu retruquei, informando-a que aquilo não era verdade. Lembrei-lhe que na oportunidade à qual ela se referia eu trazia uma paciente, vítima de atropelamento, do Hospital Ernesto Simões Filho. Disse-lhe que a paciente em questão estava regulada para o hospital e que não era meu papel levá-la à sala de TC, muito menos ao Centro Cirúrgico, após a realização da mesma, como eles desejavam. Fiz-lhe lembrar que, ainda reconhecendo naquele dia não ser minha função dar encaminhamento dentro do HGRS à paciente, aceitei fazê-lo em respeito à paciente e aos seus familiares, e nunca em consideração a ela ou ao neurocirurgião ao qual ela se referia. Aos gritos, completamente desequilibrada, a Sra. Heloísa Cunha tentou expulsar-me da unidade. O que se ouvia nos corredores eram gritos de: "saia", "saia", "saia". Naquele momento, muitos dos acompanhantes dos pacientes que estavam naquela unidade correram para assistir o tumulto que se seguiu.

Eu disse a Sra. Heloísa Cunha que aquele comportamento não era adequado a alguém que assumia o papel de plantonista daquela unidade e que só poderia continuar a tratar com ela se a mesma fosse medicada e contida. Disse-lhe que a identificava como uma Sra. em surto psiquiátrico. Ela então se virou para a mãe de um dos pacientes que ocupava aquela sala e lhe disse que eu queria que o filho dela morresse, que eu estava ali trocando a vida do filho dela pela vida de Ana Larissa. Pediu a ela que saísse da maca para que eu colocasse Ana Larissa. Aos gritos dizia: "vou dar uma queixa sua no Cremeb, você vai pro Cremeb". Após o paciente ter saído da maca, ela, ainda em surto, batia na mesma dizendo: "venha, coloque a sua paciente aqui", "venha, eu já tirei o meu "mal epiléptico" da maca pra que você coloque a sua paciente aqui", "venha". Após todo esse escândalo, ela se retirou da sala e pediu às suas colegas que não ficassem ali até que eu deixasse aquela unidade. Os pais de Ana Larissa, Sr. Carlos e Sra. Silvia pediram a ela que tivesse piedade da filha deles e ela aos gritos os expulsou de lá.

Disse a eles que fossem chorar lá fora, que ali não era lugar para que eles ficassem chorando. Sr Carlos se dirigiu a mim então e chorando me disse: "Dr. pelo amor de Deus, não deixe minha filha com ela", "Dr. como minha filha vai ficar aqui com essa "médica"?" Eu disse a ele que jamais sairia dali até que alguém em condições psíquicas assumisse aquele caso. Liguei para Dr. Jisomar e coloquei-o a par do que estava acontecendo, o mesmo ao telefone ainda ouvia os gritos enlouquecidos da Sra. Heloísa Cunha. Solicitei então a Lidysi que trouxesse o ventilador da UTI móvel para que eu o montasse naquela unidade e não os deixasse sem ventilador, a despeito de lá existirem dois ventiladores que não estavam sendo usados. Enquanto eu montava o ventilador e Lidysi "ambuzava" Ana Larissa, a Sra. Heloisa, novamente aos gritos dizia: "nunca mais você vai voltar aqui", "eu tenho quatro plantões noturnos aqui", "não apareça mais aqui", "saia das fraldas", "saia das fraldas". Eu repeti insistentemente que ela estava em surto, e disse a ela que voltaria ao HGRS quantas vezes fosse preciso.

Disse-lhe que havia recebido uma determinação para entrar com Ana Larissa naquela unidade e que a criança precisava de uma avaliação com um neurocirurgião. Ela foi novamente arrastada para outra sala dentro do PA por suas colegas que de certo já conheciam o seu temperamento descontrolado. Nesse momento, Dr. Raimundo já se encontrava no local e negou ter autorizado a regulação de Ana Larissa para aquela unidade, colocando-se ao lado das pediatras. Informei à terceira plantonista da pediatria que apareceu, Dra. Alderiza Jucá, que anotaria o nome das três médicas plantonistas da unidade pediátrica e que faria um documento para solicitar a quem de direito a apuração destes fatos que acima citei. Nesse momento, Dr. Jisomar me ligou informando que Dr. Marcos do Hospital Geral do Estado (HGE) havia aceitado a transferência da paciente para aquele hospital. Informei então à Dra. Alderiza Jucá que Ana Larissa seria encaminhada ao HGE. A Sra. Heloisa Cunha após ouvir o comunicado entrou novamente na sala de reanimação e novamente aos gritos questionava: "posso devolver meu mal epiléptico pra maca?", "posso?", "posso?". Disse a ela que sob minha ótica ela não poderia jamais estar tratando de ninguém naquela condição de desequilíbrio, mas que não cabia a mim proibi-la, ou autorizá-la, a fazer qualquer coisa.

Ela então aos gritos me disse: "vá e não volte", "você está saindo porque está com medo", "você está com medo". Eu disse a ela que não tinha condição de continuar tentando ouvi-la e que estava realmente de saída em benefício de Ana Larissa, já que eu não teria nenhuma condição de deixá-la sob a responsabilidade de alguém que não demonstrava controle emocional como ela. Disse aos pacientes que estavam ali que lamentava que eles estivessem sendo tratados por uma Sra. em surto psiquiátrico. Deixei, então, a unidade de emergência do HGRS em direção ao HGE por volta de 03h. Cheguei ao HGE às 03h15min da madrugada de 24 de agosto de 2010 e fui recebido de maneira bastante cordial por Dra. Ilana Rodrigues, CREMEB 8213, que prontamente pediu avaliação do neurologista.

Informei a ela o quadro da paciente e que Ana Larissa apresentava midríase paralítica bilateral, FC: 148bpm, PA: 79X45 (56 mmHg), SpO2: 99%, em VM, com FiO2: 100%. O neurologista, após examinar a paciente e avaliar a TC de crânio, informou aos pais que abriria o protocolo de morte encefálica para Ana Larissa. Após a notícia todos choraram dentro do PA do HGE. Ao fim, me despedi dos pais de Ana Larissa e fui abraçado pelos dois que me agradeceram por todo empenho durante aquelas mais de quatro horas de transporte. Ao sair do HGE e entrar na ambulância da CER fui novamente abordado pelos familiares de Ana Larissa que novamente nos agradeceram o empenho na resolução daquela história.

Deixamos o HGE por volta das 03h45min e fizemos, eu e Lidysi, o caminho de volta até a CER chorando por termos presenciado, e vivido, tanto sofrimento durante àquelas horas infindáveis. Chorei como há muito não fazia. Chorei destruído com a confirmação do quão frágil é a vida humana. Chorei lamentando que uma menina de oito anos tenha partido de maneira tão repentina. Chorei invadido pelo choro daqueles pais que me abraçaram agradecidos e reconheceram, num momento de perda, o nosso trabalho. Chorei porque encontrei tanta gente, que atende tantas outras gentes, sem estar de fato compromissada com isso. Chorei porque novamente vi um ser humano ser tratado como um problema, um problema cuja paternidade ninguém quis assumir. Chorei porque encontrei a Sra. Heloísa Cunha e toda a sua falta de amor, toda a sua mágoa frente à vida, todo o seu descaso e sua insensibilidade. Chorei porque encontrei abandono, desrespeito e incompreensão. Chorei porque tudo o que já era tão doído se tornou ainda pior tamanha as barbaridades que vi e ouvi. Chorei como nunca. Chorei descrente da profissão que escolhi.
Termino esse desabafo reafirmando que não acredito em mudanças reais. Os protagonistas desse drama continuarão por lá, pelos corredores do HGRS, pelos corredores de tantos outros hospitais públicos. Eles continuarão humilhando os mais necessitados - os fragilizados pela falta de saúde e de saída -, continuarão tentando intimidar os mais esclarecidos que se opõem às suas arbitrariedades. Esse desabafo existe, entretanto, para registrar a minha indignação frente a tudo isso. Seja você que me lê um instrumento de Deus por aqui. Coloque-se no lugar daquela família que perdeu uma filha e que presenciou tanto abandono. Sinta-se tocado por aquela dor e repense suas atitudes frente à vida, frente aos vivos. Tente fazer diferente. E, sobretudo, ame quem quer que seja e tenha a sorte de ser amado como eu sou. Só assim, experimentando a libertação, a salvação que é ser amado, você possa, então, ser amor nesse mundo.

Vinícius Viana Bandeira Moraes – CRM/BA: 18.761
Médico Intervencionista da Central Estadual de Regulação

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Juntos

Os tempos eram difíceis...
Acordar parecia um pesar que despertava para a tormenta. Dormir era a fuga, fundamentada nos princípios da farmacologia de um tarja preta. Aquele era o seu fim, resumia-se cada vez mais aquilo, e aquilo agora era nada...
Ao acordar um dia ouviu a frase mais inspiradora de sua mãezinha ao telefone: Filho, você ainda vai sofrer por tanta coisa. Vai sofrer pelos teus filhos, pelos teus pais, pelos teus irmãos, e por ti mesmo. Não é o último sofrimento, mas deve  passar pra dar lugar aos novos...
Algo despertou o homem dormente pela frustração. Foi ao encontro dela. Tocou a campainha, e ouviu um grito: - Espera ai...
Sentou-se na soleira da porta, e esperou. Alguns minutos depois a porta foi aberta repentinamente.
Olhou para o seu rosto delicado que agora parecia tão machucado pelas lágrimas que rolaram, seu nariz lindo estava vermelho, e os olhos cor de amêndoa com uma pontinha de decepção.
Congelou por um momento contemplando a imagem do que causara a sua única maior bem feitora dos últimos meses. A única criatura que fora paciente, que esperou seu tempo, que o amou sem nada exigir em troca. Fora ingrato na confusão dos seus sentimentos, culpava-se por não ter dado ordem em seu coração antes. Mas em poucos segundos, o silêncio do telefone desligado e o conselho que ouviu fizeram-no achar a resposta em negação, não era capaz de admitir que aquilo acontecera novamente. Amor? Jamais...
- Oi
- Você tava chorando?
- O que você acha?
- Desculpa...
- Isso não conserta tudo, alias não conserta nada. Eu te esperei, todo esse tempo, todo dia, toda noite... E agora isso?
- Eu sei de tudo isso. Não vou pedir que me entenda, pois você já fez isso. Não vou pedir que você se esforce mais por nada, não vou usar mais do seu amor como muletas pra nossa relação, não vou abusar de sua condescendência ainda mais.
Olhou nos olhos dela, e viu lágrimas brotarem mais fartas do que nunca...
- Então é isso? Acabou? Fala, vai  fala!
- Eu amo você.
- O que?
- É isso, eu te amo. Chega de te delegar o fardo do nosso relacionamento pela minha incapacidade de admitir que sinto amor por você. Seu jeito comigo, sua dedicação, seu amor por mim, me mostraram o quanto eu tava sendo idiota ao achar que não fosse capaz de sentir de novo.
Recebeu o sorriso mais tímido que já havia visto após uma declaração de amor, tão esperada por ela, e tão impetuosa de sua parte....
Ao sentí-la pulando em seu pescoço, sentiu seu coração desacelerar e se aquietar, cheirou-lhe os cabelos, e sabia que estava envolto pelos braços certos. Era ela, era ela enfim...

Tem gente...

O mundo tá cheio de gente sádica, daquelas que não pode ver os outros bem e logo tentam de alguma forma mostrar a sua existência mal intencionada. E não, não é raiva da pessoa, não é saudade, não é nada disso. É sadismo mesmo, de gostar de ver a outra pessoa mal... Pensava assim até agora pouco.
Uma situação me fez rever os meus conceitos, e sendo sincero: É mais baixa auto-estima do que sadismo! Ou acho até que o segundo é gerado pelo primeiro... A pessoa se coloca em tão baixo patamar que precisa fazer o outro sofrer para tentar elevar-se. De qualquer forma, é tão bom quando a gente se torna imune a esse tipo...
Melhor ainda é ver que tem gente que não sai do lugar, sempre os mesmos joguinhos só mudando a vítima e o trouxa a ser enganado.... Acho que sou um pouco sádico afinal? Sou sádico plateia, e não sádico ator, não sou capaz de agir para fuder alguém. Digo isso porque adoro ver quem tem que se fuder, de fato se fudendo! Já dizia meu avô: Cada um tem a vida que merece! Essa frase representa o sadismo de melhor qualidade, aquele paciente, que espera um dia a lei do retorno...
A vida segue...

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Carência

peidinho anda carente de pai...
tudo isso só porque eu tô dando uma de Lya Luft...
bá, só escrevo sobre o Del depois que vc postar algo.
E tenho dito.

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Nuvens

O tempo vai passando, e o que fica?

O que levamos embora?

O que carregamos conosco?

Mágoas, mortes, angústias, brigas, traumas, rancor, ou tudo ao contrário...

Risos, brincadeiras, risadas, besteiras faladas, olhares trocados, palavras silenciadas em horas de aperto, abraços de compreensão, beijos, “te amo’s”...

O passado, ah, o passado!

Que pretensioso ser este que nos pega e nos carrega sempre de volta a um tempo que nem lembramos mais.

Saudade... Palavra que talvez nos leve direto ao vivenciado.

Antes ter vivido. Mas e a saudade do que vai? Do que não se teve?

A mãe que faleceu, o pai doente, o irmão que bateu o carro, o amigo que se fez ausente.

Pessoas que encontramos pela vida, as almas que nos tocam e se vão antes da hora, ou talvez na hora exata.

Nunca saberemos, sempre nos culparemos ou arranjaremos meios de fuga para conseguir culpar o outro. Talvez.

Talvez nos cobremos demais – casa, filhos, família, marido, mulher, trabalho, estudos.

Qual a dose de cada coisa?

Qual a dose certa de cada pessoa?

As almas vêm e vão, como nuvens que passam nos trazendo sombra em um dia de sol.

Ou tempestade, derrubando tudo.

A verdade é que o que quer que aconteça é o que permitimos acontecer.

Esquecer ou levar embora junto na lembrança é uma opção que fazemos.

E como escolher as coisas certas?

As dores que nos farão crescer? Os amores que nos farão melhor? O caminho que nos levará ao fim escolhido? As alegrias que serão cuidadoras de nossa felicidade?

O que será realmente bom para nosso ser?

Talvez demoremos muito para perceber que certas dores devem passar e que devemos deixar que passem.

Talvez demoremos muito para notar que o outro não é de real cumplicidade.

Talvez demoremos muito para crescer sem precisar de nenhuma muleta para nos sustentar.

Talvez doa mais que o necessário.

Talvez seja a medida exata para a nossa plenitude.

A vida não é fácil. E quem disser que o é, mente.

Não precisamos carregar fardos, mas a verdade é que precisamos deles para conseguir seguir em frente.

Cada um tem a sua versão do presente. Cada um tem a sua própria consciência, inconsciência, subconsciência...

Todos nós somos só crianças.

Crianças a sós com a solidão enfiada no peito, feito lança.

O grande milagre sobre o que nos cerca é isso, ter isso tudo para enfrentar e ainda sim conseguir sair de si para se doar ao próximo.

Quando conseguem...

Alguns estão nesta vida para se fechar, outros para se abrir.

Ou os dois ao mesmo tempo, em épocas diferentes.

Ninguém é culpado, ninguém é diferente.

Difícil é saber como conseguir, como se distanciar do que é prejudicial sem tornar-se indiferente.

Saudade do que já se tem por saber que um dia irá embora.

É cruel se torturar, julgar a si com o peso de uma mão que jamais afaga.

Creio que muitas vezes temos saudades por não termos tantas coisas boas hoje para nos completar como antigamente.

Talvez eu esteja equivocada.

Só sei que sinto saudade desde já, porque amo meu momento presente. E amando sei que passará, como toda fase, como toda água deve correr somente uma única vez por sob uma ponte, jamais a mesma gota no mesmo rio...

Não derramarei duas lágrimas pelo mesmo motivo.

Todas serão sempre dores diferentes.

E meus sorrisos sempre brilharão uma alegria recém apresentada.

Meus amigos serão conhecidos novamente a cada dia.

E minha família será uma descoberta enquanto eu for capaz de me descobrir.

E que nos descubramos, porque des-cobrir é retirar toda a capa que nos faz vertermos para dentro de nós mesmo e sermos então capazes de nos mostrar, com todas as nossas rugas, falhas, amassos, julgamentos, máscaras.

Sem medo.

Sem enfrentamento.

Sem discussão.

Ainda assim, com todos os pesos, as cruzes, os amores, as dores, as felicidades, as alegrias, a momentaneidade, ainda assim, saímos de nós para descobrir o novo.

Um amigo mais velho, outro mais novo, um irmão com quem não falamos há anos, uma nova visão de alguém em um túmulo de quem só recordamos alguns poucos minutos – ou uma vida inteira juntos.

Não importa qual a situação, a verdade é que o presente sempre muda e com isso mudamos também.

Uma hora culpamos, na outra perdoamos, em uma amamos, na outra não sentimos mais nada.

Eu só queria mesmo dizer que, para mim, não importa quem eu sou para os outros – porque eu sou aquilo que necessitarem, nuvem ou tempestade, o que for melhor para a colheita -, mas me importo sim com quem eles são para mim.

Eu sou o melhor que posso ser em todos os momentos.

Eu sou o melhor de mim para mim todo o tempo.

E espero que todos também o sejam, sem tentar agradar ou mudar, porque tudo depende dos olhos de quem vê,

Devemos só procurar crescer para que, um dia, possamos também sentir falta desta época, não como alguém que morre ou que vê morrer, mas que sabe que em todos os momentos da vida teremos ventos nos carregando e que não importa onde iremos parar desde possamos sempre ora voar ora precipitar, tudo a seu tempo, sendo o melhor que podíamos ser, sem nos deixarmos cegar ou ver além da conta, uns nuvens mais acima, outros água mais enraizada no chão, não importa, desde que saibamos a hora de subir ou de descer.

Ou talvez nunca seja possível saber.

Mas se formos sempre o melhor que pudermos ser, bastará.

E bastando nada mais faltará porque seremos suficientes para nós mesmos.

Eu sentirei falta, saudade, terei lembranças, guardarei na memória.

Mas ainda assim, apesar da melancolia que às vezes abate e faz querer ficar, tenho uma forte impressão de que realmente irei embora, para o céu ou para o chão, porque temos que seguir em frente. Sempre... E isto me conforta.

Ainda bem. Ainda bem...