quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Amizade

Oscar Wilde certa vez escreveu ao final de seu texto: “...a normalidade é uma ilusão imbecil e estéril.”
Esta é uma frase que realmente me toca. De fato todo o texto dele me toca, sobre amizade. Daí eu fico assim, pensando sobre como escrever sobre amigos.
Nunca encontrei muitas palavras, sempre fui de poucos chegados – aqueles com os quais realmente podemos contar, ir na casa, rir junto, chorar no colo, abraçar sempre, pegar na mão sem medo, dar carona sem cobrar, pedir favores sem ser questionado, às vezes levar um puxão de orelha, mas jamais ser julgado... Este tipo de amigo.
Meu hall de amizades sempre foi restrito, talvez pela minha cabeça meio desmiolada, pouca gente se dá bem comigo. Esta foi a conclusão mais certa que pude obter sobre isto, não sou eu quem exige, mas os outros que não encontram o que esperam.
Eu não sou de farra, não sou de bebedeira, não sou de futilidades...
Gosto de boas músicas, levo a vida com um pouco mais de seriedade, adoro a sobriedade das coisas, sou extremamente caseira, aprecio uma boa conversa, falo besteiras sensatas e tenho as curiosidades e dúvidas mais maduras possíveis.
Isto faz de mim um alguém com espírito velho, como dizem.
Há quem me julgue pelos meus amigos. Há quem critique minhas amizades.
Me dou bem mesmo com pessoas bem mais velhas do que eu, para mim são estas as que me oferecem o que procuro!
Infelizmente há sempre um para dizer: mas que absurdo estes velhacos andarem contigo!
Outros criticam dizendo: Credo! – como se minha opção fosse a mais insensata e incabível.
O fato é que amo os amigos que tenho e o que me importa é que são eles que estão comigo.
No final do dia quem critica e julga fica sozinho. A crueldade da língua fere mais a alma de quem profere as palavras do que a quem ouve.
E eu vou pra casa dos que me querem bem e que me aceitam, mesmo com todas as diferenças – que só os hipócritas sabem ver com suas pupilas diminutas.
Eles são loucos e santos, tudo o que eu preciso!
Eles podem não ser perfeitos, podem até, talvez, não irem pro céu, mas posso afirmar com toda a certeza que eles fazem da minha realidade um paraíso profundo dos que sabem ser loucos dentro da seriedade que é necessária ter neste mundo!
Porque no final das contas, é isto o que importa...
Obrigada pela amizade de vocês.

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Daddy Issues

Um dia me disseram que por trás de um grande homem há sempre uma grande mulher, nunca fui totalmente crente nessa frase, embora nunca desacreditei totalmente essas palavras.
Pois bem, a vida tratou de me provar algo diferente dessa frase, não em essência, mas sim em sentido! A receita para ser um homem de merda é ter uma péssima mulher ao seu lado. Sim, essa é a verdade crua.
Mulheres podem ser péssimas mulheres por diversos fatores, podem ser folgadas, podem ser infiéis, ou podem  simplesmente ser pouco para os seus anseios, mas acredite esses tipos são os menos perigosos. As piores são as fodidas, sim, aquelas que têm a cabeça fodida, cheias de problemas que nem elas mesmas acham a causa.
Fato é que assim como nós homens temos uma ligação especial com a mãe, explicada pela psicanálise através do complexo de Édipo, as mulheres também tem essa ligação, tendo como figura de referencia o pai. O problema real mora na relação dela com o pai, portanto mulheres com um péssimo relacionamento com o pai durante a infância tendem a ser uma bela receita de merda com recheio de bosta! Não que toda mulher com um pai ausente, ou abusivo durante a infância vá se tornar uma esposa medíocre, mas é o caminho que tendem a seguir.
Mulheres com Daddy Issues tendem a projetar qualquer comportamento masculino nos comportamentos de seus pais. O que invariavelmente fode qualquer relacionamento, e possivelmente fode a cabeça de quem esta puxando o barco, no caso, o homem que tenta exaustivamente provar a ela que seus comportamentos são dignos, sem entender o porque de tantas discussões sem sentido. E, por mais que o cara tente demonstrar incessantemente o quão bom é, e o quanto pode ajudá-la de nada adianta. Esse tipo de mulher será sempre uma cega quando se tratar do seu próprio interior. Para ela sua relação com o pai foi uma merda e mesmo assim ela suportou tudo isso. Elas se sentem sobreviventes (muitas vezes com toda razão), e esquecem de olhar as marcas que aquilo deixou, e como isso interfere nos relacionamentos presentes.
Infelizmente, ao tentar se relacionar seriamente com uma mulher com Daddy Issues você estará tentando atravessar o Saara a pé. Conseguir é até possível com muita sorte, mas você irá se foder muito, e ser privado de muita coisa pelo percurso! Enquanto a própria não enxergar como ela projeta o relacionamento com o pai no seu relacionamento conjugal não existe maneira de ajudá-la. Resolver a própria merda já é complicado, e exige paciência, agora se imagine durante muito tempo tentando resolver a merda da cabeça de outra pessoa, que nem ao menos enxergar a proporção da bagagem que carrega. Tenso, né?
Portanto, se eu aprendi alguma coisa dentro de relacionamentos e sobre se apaixonar é perguntar. Sim, pergunte: Querida, como é o seu relacionamento com o seu pai? Você se dá bem com ele? Como ele foi durante a sua infância?. Acredito realmente que este seja um bom primeiro passo antes de se apaixonar.
Mulher com Daddy Issues mal resolvido é coisa pra psicólogo, padre, pai de santo, ou qualquer alma benevolente não disposta a ser feliz! 



PS: E antes que apareça alguém me xingando nos coments, a recíproca é verdadeira para os homens. Complexo de Édipo mal resolvido também é foda!


Culpa.

Solidão, palavra difícil de ser realmente analisada.
Qual o significado da dor de quem é só? Quais os termos apropriados? Quais os carinhos que faltam? Quais as conseqüências da falta de algo?
Ser só é uma questão de estar vivo; estar só numa existência precária de quem jamais irá dividir todos os pensamentos, as dores, amores e felicidades com alguém.
A solidão pode ser compartilhada, mas jamais vivida junto. Ela é única, e só quem a sente sabe a dor que é estar solitário.
A falta de um amor, a falta de uma mãe, de um pai, de alguém, a falta de um animal, a falta de um irmão, a falta de um amigo...
Cada um tem um tipo de solidão, cada solidão tem uma causa.
Não sei qual o remédio para esta dor, para uns fazer o bem e a caridade ao próximo é o que os mantêm próximos de Deus, de um ser que os faz sentir um pouquinho melhores neste mundo imenso de mágoas e alegrias. Para outros não há solução senão aceitar a condição infeliz de que se é só.
Existem vários tipos de solidão: a solidão de quem é diferente, a solidão de quem é só mais um na multidão, a solidão de quem nunca encontrou um amor, a solidão de quem nunca teve um filho, a solidão de quem perdeu algum conhecido, tudo culmina na falta de algo.
Mas e a solidão de quem tem muito de uma coisa?
A maior solidão não é a do ser que se ausenta, que se faz só, que é feito só pela exclusão dos outros, a maior solidão não é a do ser que não ama, que se fecha, que se nega, que não faz, que não encontra, a maior solidão, na minha humilde opinião, é a do ser que se culpa.
A culpa isola a alma da gente, faz de nossa vivência uma coisa quase insignificante, faz com que nos sintamos menores, mais frágeis, ruins, debilitados diante de uma situação que aconteceu e que nada poderá mudar.
A culpa engole a auto-estima, liberta os monstros internos, dá forças ao mau que nos atormenta. A culpa aprisiona o espírito.
E como lidar com isto? Eu não sei.
Não há soluções miraculosas, não há remédios, não há antídotos contra o próprio pensamento da gente.
E aos poucos começamos a definhar pensando no que deveríamos ter feito ou no que fizemos de tão ruim. Um comportamento malcriado, um xingamento inapropriado, um descuido na estrada, uma morte desnecessária, tudo pode gerar uma culpa dentro daquele que se arrepende.
Há quem estude e diga que a culpa é invenção do ocidente, a igreja católica e seu Deus que vai mandar todos pro inferno se não for feita sua vontade. A culpa pelo medo, a culpa pelo que nem veio, nem aconteceu.
Seja lá a causa da dor, a solidão de quem se culpa é a maior que se pode ter.
O cobrar-se de ter sido diferente, poder ter mudado, escolhido outro caminho, retornado e voltado ao ponto de início.
Dizem que nada acontece fora da vontade de Deus, mas e as displicências? A falta de cuidado? Onde entra a real culpa do homem sobre o acontecido? Tem que haver limites razoáveis.
No oriente as pessoas também se culpam, se matam e se fecham da mesma forma por motivos diversos. Os suicidas do Japão, adolescentes que ao se sentirem fora do padrão, fora do vestibular, que por não saber o que querem, excluem-se de vez da vida.
A culpa da falta de auto-perdão.
Como perdoar-se? E se somos solitários, para quem pedir perdão? Quem ouvirá nossas desculpas e nos provará que seria daquele jeito independente de nossa vontade?
Temos que evoluir e pedir trégua para nós mesmos. Atirar-nos à solidão de quem quer conversar consigo e se escutar, ser seu próprio melhor amigo.
Temos que nos levantarmos sozinhos, porque somente nossa própria consciência pode nos livrar de tal fardo.
Pedir perdão a si mesmo é uma das coisas mais difíceis, e conseguir perdoar-se de coração é outra que, para mim, parece-me impossível.
É mais fácil perdoar o outro do que a si, porque a escolha do outro era uma simples escolha, mas a nossa era para ter sido com responsabilidade e não uma mera decisão. Nos culpamos por nos conhecermos e nos cobrarmos o melhor.
Creio que a chave para amenizar tal solidão esteja em conseguir ver que aquele foi realmente o melhor de nós.
Eu ainda não sei me perdoar por muitas coisas, porque minha cobrança é mais leve algumas horas e mais pesadas em outras.
Às vezes parece-me que só pensar que dei o melhor de mim seja uma desculpa para não me melhorar, não me policiar, livrar-me das conseqüências. Mas sei que ao mesmo tempo me equivoco e muitas vezes até me contradigo.
Porém de uma coisa eu tenho certeza: a culpa fere, castiga, impede, debilita e mata.
A pior solidão é a do ser que se culpa, porque a culpa não exclui a convivência diária com outros, mas de nossa própria alma nos afasta.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Ahhhhh Dell...



Um cão. Foi assim que defini o Dell pela primeira vez...
A verdade é que antes de ser um cão, o Dell foi pra mim um impulso. Eu, como sempre, em um momento de
tristeza pseudo revoltosa quis mandar o mundo a merda, e cheguei a milésima vez na mesma conclusão: - Pessoas não prestam, quero um cachorro!
Assim o Dell veio parar no meu carro naquela quarta feira pós plantão, pós prova, pós aula, pós apocalíptica, pós revoltosa. Quando me deparei com aquela bola branca, só me veio um pensamento: - Cão!
Primeiro, o cão ganhou nome: Dell. E a partir daí esse nome seria aquele que mais ecoaria na minha cabeça. Ainda durante a viagem fui presenteado pela primeira vez: Um vómito, e um xixi! E me deparei pronunciando a frase mais famosa dita por mim um dia: - Ahhhhhhhh Dell...
Confesso que enquanto definido como Cão, ou como Dell, pensava diariamente em devolvê-lo, vende-lo, transformá-lo em sabão, ou qualquer coisa que me livrasse dos intermináveis festivais de xixis, chinelos destruídos, ou ainda buracos no sofá! O Dell comeu (come ainda) qualquer tipo de coisa, animada ou inanimada, seja uma lagartixa, ou seja uma moeda(?), e a cada vez que isso acontecia eu me via pronunciando a famosa frase: - Ahhhhhhhhhh Dell... Era tudo tão estranho, de alguma forma aquela bola de pelos brancos só bagunçava a minha vida, mas alguma coisa me impedia de me livrar daquilo que eu mesmo havia procurado.
A solução era conviver com o problema, para isso eu e o Dell mudamos. O Dell deixou de ser só Dell, e virou Porco, Delicious, Demônio, etc... Eu deixei de ser só eu, e me tornei pai, amigo, dono, responsável. A cada dia que passava, eu aprendia a duras penas as lições que ele me ensinava, fosse através da malcriadeza, ou de "dar a patinha" quando eu pedia. Fato é que nos tornamos uma dupla. É incrível como vejo parte dos meus comportamentos nele, minha teimosia, meu gênio forte, minha determinação. Por outro lado, ele se tornou parte de mim, me vejo cada vez mais sendo carinhoso, e paciente, coisas que o Dell me ensinou.
Hoje, ainda nos estranhamos, seja pelo fio mordido do computador, seja pela minha mania incontrolável de tentar mantê-lo limpo. E, é claro que eu ainda olho para ele quando estou bravo e digo: - Ahhhhh Dell.
A diferença é que ele me responde com a cara mais arteira do mundo, e late! No fundo, fui eu que aprendi a ouvi-lo.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

No final.

Natal... É época de festejar.
Para alguns esta é uma verdade, para outros nem tanto.
Para a minha pessoa este é um tempo de despertar, como todos os dias.
Eu não sou fã de natal - a data comemorativa comercial -, não me apaixono pelos enfeites e Papai Noel pendurados para todos os lados. Mas uma coisa que me fascina são as luzes.
Luzes sempre me fascinaram, adoro andar de carro à noite e ver a cidade ao longe, com todas as suas luzes piscantes como se fossem estrelas a nascer.
Creio que Natal e Réveillon são para isso, para iluminar.
Há sim muita hipocrisia sobre todos ficarem solícitos somente nesta época do ano, porque a verdade é que deveríamos ser assim todo o tempo, mais durante todo o ano que só no final dele.
Mas como nada é perfeito, ao menos temos o natal para celebrar e podermos nos tornar mais amenos durante uma vez nestes 365 dias que nos enforcam na correria, nos afazeres, no caos do dia a dia.
Para mim Natal é para isto, para nos tornarmos melhores pessoas não só com os outros, mas conosco, com o nosso próprio Eu.
É hora de abrandar a alma e se cobrar menos, colher os frutos de todo o suor, viajar, ver os amigos, reunir a família, dizer que ama, retomar antigas lembranças, construir novas memórias... É hora de se aproximar de Deus - seja de que religião se for, seja lá qual Deus naquele em que acreditar. É tempo de se voltar para dentro de si para que na quietude das coisas em meio às canções natalinas possamos nos ver com mais clareza, anotar os defeitos - jogar fora as desavenças - melhorar as virtudes - cultivar o amor (principalmente o amor próprio) - é tempo de renovar.
Inovar e renovar com a esperança de que um ciclo realmente se fecha para que outro, com outras bênçãos, possa vir e habitar nosso lar sem o menor pudor.
A energia desta época do ano é indiscutivelmente uma das melhores que se pode sentir em termo coletivo. Todos ficam em um estado extasiado de felicidade contida de quem esperou o ano todo para finalmente sorrir.
Então tudo o que eu desejo neste final de ano, com as festa das mais diversas religiões, das mais diversas culturas, dos mais diversos desejos é que todos possam ser mais pacientes consigo mesmos.
Tracem metas que sejam cabíveis e um objetivo que realmente motive. Mantenha aquele sonho impossível aceso e aumente a força de vontade.
Olhe para si mesmo, ame-se mais, tolere-se mais, esforce-se mais, sabendo que todo o esforço já feito foi o melhor que se poderia fazer.
Aceite-se como é e aceite melhor as diferenças. Ninguém é perfeito... Mas todos podemos melhorar, sempre. Foque em si mesmo.
Deixe de lado as verdades alheias, os olhares de reprovação sobre si mesmo, quebre o espelho se for necessário e compre outro novo, inove a imagem de si mesmo, seja capaz de se ver sob um novo ângulo, dê-se a oportunidade de novas perspectivas.
Não imagine coisas impossíveis que só serão lembradas no outro Natal. Não fique esperando o carnaval chegar para novamente confraternizar... Espalhe sempre alegria.
O maior presente que Deus nos deu, além das virtudes, foi a sabedoria de saber sorrir.
Isto poucos sabem, sorrir de verdade, com a alma, com o coração.
Sorria durante todo o ano, mesmo que esteja só começando agora.
Lembre-se de chorar quando der vontade, às vezes uma lágrima contida pode sim trazer arrependimentos, não tenha vergonha de se mostrar.
Desnude-se. Permita-se.
E ame, acima de tudo, ame. Porque o amor é universal e pode ser sentido por qualquer um, mesmo à distância.
Tudo o que desejo são manhãs leves, não dias necessariamente fáceis, mas cheios de aprendizados.
Desejo que nada fique como antes, que tudo renasça, que os votos sejam feitos novamente mesmo que somente com olhares durante uma noite de verão.
E que, independente de ser natal ou ano novo, todos sempre saibam que todos os dias é dia de celebrar, de ser mais calmo, mais paciente, amoroso, menos rancoroso, mais próximo do perdão...
Que não seja só nos finais de ano que se troque palavras mágicas sobre como e o quanto se ama e se quer bem.
Eu os quero bem sempre, e sempre procuro mandar mensagens sobre isto.
Que a consciência sobre falhas seja grande, e que também saiba-se congratular, mesmo que em silêncio consigo mesmo, os ganhos que se obteve durante o decorrer das horas.
Têm pessoas que dizem não orar, não amar, não querer nada com os outros nem com nenhum Deus, mas eu digo que o simples pensar e fechar os olhos, sorrir sem se perceber, lembrando-se com carinho de alguma coisa, pessoa, momento ou fato já é em si o início de uma prece.
E desejo, acima de tudo, estes pensamentos a todos.
Porque é através destes pensamentos calmos e felizes, de completa compreensão de que se é feliz de alguma forma, mesmo apesar de todas as cicatrizes e feridas ainda abertas, que todos nos encontramos.
É bem ali, na meditação diária em que se sente uma energia boa, alguma coisa quase divina presente que estamos de fato em comunhão com Deus, com o divino.
Desejo que a vida não seja simples, mas que a maioria das noites sejam de descanso.
Este é meu pedido para O velhinho lá no céu: que meus amores que realmente tanto amo possam ter esta calmaria durante seus sonos e que ao amanhecer eles saibam: nos encontramos... E que isto lhes aumente a força e sabedoria para continuar.
Porque no final das coisas, este mundo é sim maravilhoso!!!...
E vocês sempre poderão me encontrar, em algum lugar, após o arco-íris, sempre com os braços abertos e com muito, mas muito amor para dar!

Honra e Humildade

Vira e mexe eu escrevo sobre perdas.
Este é um assunto que realmente me comove toda vez.
Seja pela sua força ou dificuldade, ele mexe comigo.
Saber perder é para poucos; numa sociedade onde fracassar não é permitido, onde não ter significa ser excluído, onde ouvir um 'não' não é aceitável, perder se torna um castigo inafiançável.
Não se ensina que o perder algo também traz junto um ganhar.
Não ensinam porque é muito difícil aceitar que perder um ente querido seja crescimento para algum parente. Nunca pensam no ganho espiritual até do que se foi.
Não ensinam porque é muito difícil ver que perder um grande amor seja para benefício próprio, já que o outro muitas vezes sai e acaba aparentemente sendo mais feliz fora do que fôra dentro. Como entender isso?
Mas o mais difícil, e ainda não pensado por mim: como é complicado perder por escolha... A escolha do renunciar, a perda por opção, por saber que é o melhor caminho.
Como conseguir ver que não ter, não chegar lá, não lutar até o final é melhor para si sem demagogias sobre covardia e medo?
Podem até dizer aqueles que sofreram que poder escolher é muito melhor do que perder sem aviso prévio.
Mas como estão equivocados!
A maior perda e o maior aprendizado está quando temos que abrir mão de um sonho, de uma conquista por sabermos que nossa jornada acabou ali. Ter a consciência desperta, ter a completa noção de que aquele foi nosso melhor e que aquilo que conseguimos foi tudo o que restou - não há mais o que ganhar, é hora de perder - isto sim é para pessoas humildes e raras na vida.
Cada vez mais o que vejo são criaturas indo em direção ao abismo e se empurrando cada vez mais para ver até onde os olhos são capazes de ir antes de serem engolidos pela própria escuridão que olha de volta.
Foram pouquíssimas, quase só uma ou duas, as que eu vi assumirem e levantarem a bandeira branca quando tudo já estava praticamente ganho.
Ter nas mãos e saber abdicar, pior, saber abdicar sem ter ganhos reais e aparentes - objetivos e concretos - naquele exato momento.
Isto, um dia, eu quero aprender: ter a valentia de quem sabe que pode e a sabedoria de quem sabe que não deve.
As perdas são inúmeras e por diversas causas, o importante é saber quando elas devem acontecer, quando poderão acontecer e quando acontecerem, que sejam superadas.
Eu admiro quem já perdeu por opção na hora exata em que deveria.
Vencedor não é aquele que levanta o troféu, mas sim aquele que sai de cabeça erguida.
A honra muitas vezes está na humildade de saber renunciar.

Arrependimento

A grama mais bonita estava sob os seus pés naquele dia, o céu mais limpo sobre sua testa, e o ar mais puro adentrando as suas narinas. Apesar de o tempo ter lhe dado expressões na face das quais não fazia muito gosto,  sabia que queimou cada lágrima derramada através do arrependimento.
Estivera pensando em como se é feliz, mesmo com tudo, mesmo sem nada, mesmo tendo somente a si mesmo como maior e único pertence. Bastou-se por um segundo, preencheu tudo aquilo que havia corrompido em si mesmo.
Até que o céu escureceu, ao abaixar o olhar viu a grama dissolver-se em um asfalto negro, a tosse deu lugar aos pulmões que antes se expandiam. Era fruto do seu pensamento, sabia ele. Conhecia tudo aquilo a ponto de identificar o que lhe perturbava a mente de novo.
Tropeçou em algo estranho aos dedos calejados dos pés. Um jarro antigo, empoeirado, tratado com desprezo pelo tempo, assim como a sua face. Curvou-se ao chão, e ao colocar as mãos naquele objeto inusitado, sentiu como se um calor fosse trazido para dentro de si. Segurou com as duas mãos e antes que percebesse dali saiu uma voz:
- Filho, me encontraste! Em meio a uma paisagem de tanto desespero, vejo que precisas de mim... Portanto, te concedo o direito a um pedido. Muda o que quiseres, muda o dia que tornou tua face triste, muda o momento da primeira lágrima, muda...
Por todo o sofrimento, por toda a perturbação do pensamento havia se tornado apático ao ver o céu enegrecer, mas precisava responder aquela proposta tão convidativa. Abriu a boca, e sentiu que se falasse as palavras despencariam de sua boca até o chão, não chegando aos ouvidos de ninguém. Estivera acostumado com essas situações, mesmo assim balbuciou:
- Qualquer coisa? Posso mudar qualquer coisa?
Esperou um instante, e dissipou da face o olhar esperançoso de ouvir alguma resposta. São os remédios, malditos remédios, nunca me servem como deveriam. Ainda escuto coisas...
- Podes pedir qualquer coisa!
As sobrancelhas se arquearam mostrando a indignação aquilo. Sua mente insana estava captando uma percepção real.
Pediu um segundo para pensar, e carregou seu pensamento ao momento da primeira lágrima. Aquela tão sofrida, que o fez perder a juízo, a sanidade, que o tornou quem nunca desejou ser. A trajetória fora tão dolorida, mas o tornou tão mais forte. Se expôs ao mundo, mas construiu uma fortaleza dentro de si mesmo. Não tinha mais quem tanto desejou ao seu lado, mas tinha a si mesmo, ainda que fosse todo esculhambado pelas rachaduras de personalidade, e insanidades passageiras. Tinha a si mesmo...
E como conviveria com o arrependimento de não querer voltar aquele a momento. O arrependimento provavelmente agravaria a sua situação tão frágil. Quisera nunca ter de decidir consertar nada... Parou.
Respirou, e os lábios se abriram novamente:
- Quero voltar a alguns minutos atrás e nunca ter tropeçado em ti.
Como combinado o jarro cumpriu sua parte...
Os minutos se retrocederam, voltou ao seu caminho, e mesmo com o céu escurecido, e o asfalto negro sob os seus pés, não carregava um novo arrependimento... Era tudo que queria...

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Almas

É incrível como certas pessoas tocam a gente.
Creio que pela correria do dia-a-dia, a falta de tempo, pelas muitas coisas para se fazer vamos ficando mais endurecidos.
Aos poucos as coisas e pessoas deixam de nos tocar, tudo fica meio banal e nada do que acontece com o outro parece nos importar de fato. É assim, em meio ao nosso próprio caos que deixamos de ver o furacão que está em volta dos demais.
Nos importamos demasiadamente com o próprio umbigo, cremos que temos todas as soluções para os problemas alheios, mas os nossos...? Ah! os nossos ninguém resolve e ninguém entende.
Então eu fico me perguntando sobre como algumas coisas de repente nos tocam mais do que outras. Como certos olhares realmente nos chamam a atenção, seja pela alegria e brilho contido neles ou pela tristeza represada em lágrimas; como certos sorrisos nos parecem mortos e outros tão vivos; como um silêncio às vezes significa tudo e como mesmo todas as palavras não seriam o suficiente para amparar determinados sofrimentos.
Muitas coisas, diversas coisas e pessoas me tocaram durante a vida, mas devo confessar que cada vez mais são menores esses toques, esses reconhecimentos almísticos de quando só o estar ao lado da pessoa já é estar um pouco mais curado dos próprios males ou só o pensar já é dividir uma felicidade que só aquela pessoa sabe como sentir assim como você.
São cada vez menores as almas que se importam, que realmente estendem a mão, que nos ajudam quando estamos no chão - mesmo que não por termos caído, mas por termos nos deitado para um simples exercício.
Um dia, assim numa tarde calorosa, eu entrei em um recinto e encontrei uma pessoa sorrindo. Desde então ela não pára de me sorrir, mesmo quando estamos em completa aflição.
Um ser iluminado que talvez nem tenha noção do tamanho de sua real natureza.
De alguma forma eu me senti conectada, nunca vou saber se é recíproco ou qualquer coisa parecida, só sei que de alguma maneira este ser me olhou na alma e eu então pude sentir a presença dele, ou vai saber foi o contrário. Não importa.
As ajudas que temos quando mais necessitamos nem sempre vêm como esperadas.
Posso dizer que muitas vezes precisei de amigos que não estavam do lado quando eu mais temia cair. Aprendi a andar sozinha, da maneira dura como sempre dizem que é a vida. Caminhei só a sós comigo e com Deus logo quando 'pequena'; já encontrei muitas outras criaturas solitárias como eu, gente que aprendeu a ficar de pé sobre espinhos de rosas - ora uma visão linda, ora uma provação tortuosa.
Alguns, talvez, tenham se desviado do caminho.
Só sei que esta pessoa, para qual dedico não só o texto, mas dou toda a minha admiração e os poucos outros recursos que posso oferecer, passou por tempestades das quais eu talvez jamais saiba qual o gosto da água, qual a fúria do vento, qual a força do frio, qual a profundidade da fome.
Têm pessoas que nos tocam.
Ao lado desta pessoa posso dizer que sou eu mesma sem medo, sem vergonha. Talvez não da forma completa como deveria, mas de uma maneira tão leve e sutil que às vezes me espanta em ter tido isto desde o começo, sem precisar de prévias apresentações, de maneirismos e tiques nervosos que fossem amenizados com o tempo, sem precisar me explicar e sem ter medo de me despir.
Esta é talvez uma das pessoas que, na vida, mais tenha me tocado.
Não sei falar detalhes, não conheço as intimidades, não sei de toda a história vivida. Mas se me perguntarem qual a alma com mais cicatrizes que eu já tenha sentido, posso dizer que foi esta.
Não sei dizer exatamente o porquê, essas coisas a gente só sente. Talvez seja pela transparência ao estar comigo - aquela transparência que às vezes mesmo querendo esconder, de relapso, a gente mostra; talvez tenha sido só um reflexo do que eu mesma tenha mostrado; talvez seja alguma coisa impossível ou inexplicável...
Seja lá o que for, de alguma forma eu sinto esta alma e ela, num dia caloroso de um meio de semana, me tocou e deixou em mim uma cicatriz que toda tarde se abre para toda noite se fechar...
Muitas vezes não temos noção do tamanho de nossa alma, e uma forma de mensurar de maneira pequenina é sabendo que tudo aquilo que se planta, um dia, colher-se-á.
O tamanho daquilo que se colhe é do tamanho daquilo que se dá.
E eu posso dizer que uma das melhores coisas na vida é poder semear quando o outro menos espera e depois colher quando jamais poderia imaginar.

Umbigo

Quando estiver só imagine somente meu ser por sobre o teu, cobre de asas os pensamentos e voa em direção ao meu umbigo.
Lambe os desejos para dentro de mim e sacia minha fome de teu corpo, suave e fresco, como o destilar mais puro já degustado por uma boca.
Arrebenta minhas algemas e sente o percorrer de minha mão por dentro de tuas costas, como quem contorce para dentro todas as unhas afiadas pela união.
Prova minhas coxas como quem sufoca o penar num delicioso pedaço de manjar e no silêncio da noite liga todas as luzes para que possa me ver bem por sob teu ser.
Acaricia a vontade de me ter para junto de teu ser, e sente no vai-e-vem a quentura de minhas umidicidades escondidas.
Fortalece o enlace e força para dentro tuas alvuras tão esperadas, tão demoradamente abstratas em meu ser.
Imagine somente meu materializar e suaviza os beijos, enaltece os abraços, me cobre de carinhos e olhares fixos de quem sabe em que pensamento me encontrar.
Sente meu corpo descendo por sobre o teu e, com todo o demorar, imagina minha boca com vontade própria parando onde queira sem paralisar qualquer movimento.
Maltrata minha nuca com puxões e beijos, arrepia minha espinha com tuas posições de acrobata e descansa por sobre meu ser todo o sono da noite.
Solta com leveza teus músculos e imagine o dormir.
Sonha por sobre meus seios com toda a noite vivida em pensamento e torna realidade o desejo de saciedade que tenho de teu ser.
Feche os olhos e dorme para que depois eu também possa te avivar e te imaginar quando nos encontrarmos no mesmo sonho, acordada ou dormindo, contigo em meu umbigo começando tudo de novo...

Quisera

Quisera deitar-me nos braços da noite maltrapilha sem estrelas e alucinada pelo vento cretino que bate em minha janela.
Quisera despir-me nas nuances das cores cruas e frias das nuvens que não alcanço descrentes e dégradés por sobre a lua que não sinto.
Como me desejaria ser nua por sobre um colchão de cetim com fios tecidos à mão por aquele que percorre meu corpo como óleo de amêndoa ao deslizar por entre minhas curvaturas.
E desfiar todas as costas daquele ser com minhas unhas afiadas, como gata que desalinha todo um sofá por puro prazer de ser.
Apanhar com a boca todas as uvas orvalhadas de seu vinho já quase como vinagre de tanto me esperar... Como quisera destacar da pele todas as cicatrizes como numa escoriação para deixar por cima o meu desenho de desejo marcado em sua história.
E ao ouvir o badalar das horas, rir freneticamente como quem entra em comunhão com os deuses ao obter o orgasmo mais sedutor de toda uma vida.
Seduzir novamente aquele que me olha e me contorcer através do frio que insiste em bater, torturando os sentidos e fazendo amor com os olhos sem piscar uma única vez.
Lamber todo o céu nublado, suado de todos os prazeres humanos dos corpos que fazem amor ao mesmo tempo transpirando e inspirando todo o perfume do entrelaçar.
Como quisera salpicar na língua todo o seu sal formado de suor e lágrimas e bailar no quintal cheio de vinhas as ruínas históricas que me trouxeram até aqui.
Um oceano de ondas magníficas, como desejaria morrer afogada!
Seus braços que embalam para frente e para trás todos os meus pensamentos hermeticamente calculados sobre o que sentir ou o que falar.
Perco os sensos e sussurro qualquer coisa, porque já não me é razoável pensar.
Meu consciente despede-se de mim e meus instintos sobram feito eternidade, um tango redundante e coerente de passos ensaiados por sobre uma cama.
Sua pequenez sabedoria sensata, deixe minha sensatez para os gnomos de contos-de-fadas.
Alucinação traçada com os dedos em todo meu corpo. Minha 'cãibrosa' barriga, sua 'arrepiosa' espinha, minhas sussurrantes falas, sua 'gemiosa' resposta não clara.
Meus ouvidos sonham ouvir seus gemidos tortuosos de falas grossas e de palavras aladas, voando para meu céu de nuvens descrentes, espantando o frio que maltrata, cobrindo meu céu de estrelas e fazendo brilhar novamente minha lua, acima de todas, para que eu novamente volte a sonhar...
Quisera me deitar por sobre os braços maltrapilhos da noite e não mais pensar, e calar, e só fazer amor com o mundo, sendo minha morte o meu gozar.
Quisera...

Escrever.

Eu não tenho muitos medos.
Meus medos são realmente poucos, mas um que sempre prevaleceu, seja por um motivo ou outro, é o de não ser boa o suficiente.
Ouvir aquele "não, você não é o que esperávamos, nem o que desejávamos, nem o que queríamos".
De alguma forma estas orações sempre me foram as piores para se ouvir.
Aprendemos a viver num mundo de "sim" e poucos "não's".
Educação ou cobrança interna, seja o que for eu pouco sei lidar com a questão do não ser o que eu mesma esperava para mim.
Eu escrevo, e meu maior sonho e maior medo é publicar qualquer coisa que seja em meu próprio país de alguma forma. O medo da rejeição.
Queria ser a melhor no que faço, queria ser boa o suficiente para ao menos publicar e vender alguma coisa, viver disto, talvez, quem sabe, um dia - assim como raros casos neste país de incultos.
A língua bela maltrata.
Maltrata meus desejos oriundos de um dom mal visto.
Mal quisto e mal falado, ou muito ruim ou muito bom, não há meio termo.
Será?
Então eu fico assim, renunciando ao meu sonho de vida pelo medo do "não".
Poderiam me dizer que até mesmo os grandes um dia foram rejeitados, isso não conforta, aflige ainda mais.
Alguns levaram anos, outros décadas, outros só após a morte.
O que me contenta é pensar que quem me lê sente algo mesmo que só um pouco.
Uma gota a menos de solidão, uma alegria a mais, quem sabe tudo o contrário, mas sempre alguma reação.
O bom da vida é isto, causar reação nas pessoas. Vê-las sorrir ou chorar ao ler algo teu. Realmente tocar aquele que lê, que te sente, que se sente no que vê.
Andei procurando umas editoras recentemente e decididamente irei mandar alguns textos meus compilados já formando um livro.
Quem sabe quantos anos passarei ouvindo "não".
Quem sabe o quanto irei me surpreender ao ouvir um "sim".
Seja lá como for, espero que valha a pena.
Espero ter condições de sempre continuar e não deixar o julgamento dos outros influenciarem minha escrita.
Porque no final é isto só o que temos, nossas convicções e nada mais.
Nossas verdades intrínsecas.
Eu escrevo, e quem me lê sabe... Sou o que digo. Nem mais nem menos.
Seja um não ou um sim, Eu sou isto e espero que palavras nunca sejam capazes de me explicar ou resumir, porque é assim que saberei que nunca irei me acabar.
Escreverei até o fim, e é escrevendo que me realizo comigo.
Este prazer somente eu sou capaz de me dar...
O orgasmo real da vida em saber que se vive tudo aquilo que se deseja viver enquanto se está vivo.
Redundância cabal e apropriada...
Eu tenho poucos medos... E espero que os poucos não sejam aqueles que definem minha vida pessimista, mas os que me motivam, que me promovem, que me fazem ir além e acabar de encontro comigo mesma.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Cura

Discutir: do latim discutere. Debater; examinar, investigar, questionando; pôr em debate, em discussão, contestar; defender ou impugnar; travar discussão, questionar; tomar parte em discussão; questionar, contender.
Contenda: dev. de contender. Guerra, luta, combate, peleja; esforço para conseguir alguma coisa.
Discussão: do latim discussione. Ação de discutir; debate, controvérsia; polêmica; altercação, contenda, disputa.
Rancor: do latim rancore. Aversão profunda ou ressentimento amargo, não raro sopitado ou reprimido, ocasionado por algum ato alheio que causa dano material ou moral. Recordação tenaz e hostil de tais atos ou de acontecimentos análogos. Ódio.
-Aurélio (1975).

Sempre na vida iremos discordar de muitas coisas. Muitas das vezes essas coisas serão de importância vital para nosso amadurecimento enquanto outras vezes serão puras besteiras das quais um dia até mesmo teremos que abrir mão para que possamos de fato crescer de verdade, sem as amarras frouxas da futilidade.
Seja pelo o que for, discutimos.
É extremamente difícil admitir e aceitar de coração verdades que não sejam as nossas, na vida acho que não encontrei ninguém que de fato respeite o outro a ponto de não julgar nem ter que rebaixar o outro a um posto de ser não-evoluído para com isso poder "aceitar" melhor a posição contrária.
O ser humano tem falhas, uma delas é a achar que engolir e socar verdades é uma solução eficaz para os problemas.
Primeiro que discutir não é resolver, não é encontrar soluções, não é apresentar pontos plausíveis e ouvir os pontos do outro, não é recípocro - apesar de ser uma via de mão dupla.
Discutir é somente apresentar armas - alguém irá morrer.
Com o tempo aprendemos que esta não é uma solução, isto não é ao menos a busca por uma solução, é apenas uma guerra fria, não declarada, de armamento escondido - aquelas verdades que doem no peito do outro e que são faladas por pura covardia de quem discute.
Com o passar dos dias, anos e amadurecimento aprendemos a controlar os impulsos, a conter as palavras amargas, a escolher os pensamentos e, principalmente, aprendemos a deixar passar - a não guardar rancor.
Ainda assim terão vezes em que explodiremos. Aquelas vezes que desejamos nunca terem acontecido, que nos envergonhamos por termos levantado a voz - mesmo quando se teve razão, naquela hora a razão não importava, não era fator forte o suficiente para explicar um tapa, um palavrão, um olhar amargo, um grito desesperado, nada.
E dai, quando isto acontece, eu me pergunto se todo o amadurecimento valeu para algo, porque eu caio tantas vezes... E quando conseguirei somente ficar de pé, para que um dia eu possa finalmente voar?
O fato é que iremos cair tantas vezes quanto forem necessárias para aprendermos algo a mais: um pensamento melhor, uma paciência maior, para aprendermos a sorrir ao pedir perdão e ao perdoar.
Nem sempre compreenderemos. E compreender nem sempre importa.
Porque crescer é aprender que discutir não leva a nada, mesmo quando ambos estão falando baixo, quase em silêncio.
Os dias passam e um dia, numa tarde tediosa, tudo volta a ser melhor do que era.
O que realmente resolve não é argumentar, mas sim explicar e ouvir, com calma, as verdades de cada um e, em uma suplica de paz para Deus, conseguir enxergar o outro sem julgar e é também quando conseguimos ver as próprias falhas presentes naquelas nossas verdades tão potentes e intocáveis.
Saber pedoar não é esperar do outro o melhor dele mesmo, mas sim exigir de si o melhor que se pode ser para aprender a coisa mais difícil do mundo: amar só por amar, amar como a si mesmo.
Saber perdoar é se melhorar para que o outro também fique melhor.
É engolir o próprio rancor, a própria mágoa, a própria tristeza, o próprio orgulho, a própria mesquinhez, o próprio egoísmo e egocentrismo.
E como isto é difícil, exigir de si algo que talvez o outro nunca vá fazer: crescer.
E é ai que mora o segredo para a felicidade em conjunto: não exigir do outro uma responsabilidade que é individual, que é 'tua'.
Às vezes cansa, é verdade, mas vale a pena porque aprendemos também a ter paciência e paz e a vermos o momento certo para conversar, dialogar - falando e ouvindo (de verdade!).
É quando sentimos o momento certo em que nossa humildade aumentou e nosso narcisismo diminuiu e que ficamos gratos pelo outro não ter concordado, mesmo num momento de raiva ambos tendo levantado as armas, ainda assim se é grato, porque nos ferimos, mas também nos curamos.
E não há algo maior para se aprender do que a cura, a cura de si e dos demais.
Isto eu aprendi: perdoar o outro é curar a si, é livrar do próprio peito todo o mal que havia quanto às coisas rancorosas da vida... Seja as que nos faziam mal ou as que estavam em nós e faziam mal aos outros.
"Quando eu estiver contigo no fim do dia, poderás ver as minhas cicatrizes, e então saberás que eu me feri e também me curei." - Rabindranath Tagore