segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Bem-vindo!

A verdade é que no fundo eu sempre me perguntei quando minha cachorrinha morreria. Sempre me questionei se seria antes ou depois d’eu sair de casa, e secretamente sempre pedi para que fosse antes.
E foi antes, o que eu nunca imaginava é que ela morreria da forma como eu mais temia: afogada. Eu imaginava que ela só morreria assim caso eu me mudasse, me ausentasse, saísse.
Pensava que se acontecesse antes seria algo melhor, leve, velhice, morte natural, morrida assim – como quem só recolhe o espírito e vai.
Creio que este meu medo era o de que tudo sairia do lugar se eu fosse embora, se eu deixasse a casa por um momento, uma semana – que fosse – seria o suficiente para ninguém vê-la se afogar.
Acabou que aconteceu comigo aqui. E isto mostra que realmente a gente não faz diferença.
Por mais que queiramos e desejemos ser A pessoa para alguém, o fato é que a vida continua com ou sem a gente!
Sim, pode morrer, adoecer, sumir, a vida continua.
As pessoas até podem ficar naquele luto pra sempre... Mas isto seria apenas o comodismo.
O cômodo - o caminho mais fácil.
E como é gostoso ter este comodismo, ele dá uma preguiça, uma estabilidade, uma certeza tão ilusória mas deliciosa.
Vou saindo de casa, e ainda seguro no peito as lágrimas que não chorei – eu não irei chorar!
Hoje chegou rápido, depois de 22 anos...
Hoje eu perdi duas vezes o mesmo ônibus, por um minuto, mas perdi, e talvez tenha sido o meu comodismo – o querer ficar, a criança que pede mais um segundo, mais um afago, mais um abraço, mais um tempo, porque ela ainda não quer crescer.
E como é bom voltar pra casa – mesmo ainda nem tendo ido embora!
A sensação é a de que vai ficando um enorme pedaço e uma enorme facilidade também.
Vinte e Dois Anos – durante quatro anos eu fiquei acomodada, continuei em casa até porque não havia razão para sair ainda.
Hoje, bem hoje, eu não sei se é comodismo ou já uma saudade. Talvez um misto dos dois, uma nova realidade que se abre aos meus olhos.
De repente, sem esperar passar no vestibular, eu passei. Deus escreve certo por linhas tortas. Não estudei, não me esforcei, fiz algo para não ter que dizer que ‘não fiz nada’. Consegui.
Assim, como quem não procura, encontrei o curso que eu tanto queria, uma faculdade respeitada, uma cidade que dizem ser acolhedora, e tudo pertinho de casa – creio que agora, mais do que nunca, a casa dos meus pais.
Há uma enorme relutância, uma amargura e birra, mas não posso me deixar acomodar.
Eu sou grata, grata por minha cachorrinha ter morrido comigo – e eu não conseguir culpar ninguém além de mim mesma por não tê-la socorrido, sou grata por um curso que eu nem imaginava, sou grata por já ter um apartamento lá – com meu irmão, sou grata por ter esta nova oportunidade, sou grata... Mas confesso que meu coração ainda se parte pensando em como seria bom ficar, só ficar, quietinha entre as almofadas – feito gatinho que às vezes arranha e briga, mas que adora a energia e presença daqueles que ama em casa.
É preciso crescer, abrir as asas – porque eu não sou gato, talvez um pássaro, apesar de fortemente desejar ser um peixe.
Está na hora de deixar o cômodo de lado.
E aos poucos, depois de vinte e dois anos, a gente cresce... Alguns casais voltam ao tempo em que se conheceram e voltam a se olhar e construir novos sonhos, outros enfrentam a dura realidade que é a de não serem nada mais do que pais – não mais um casal.
Alguns filhos amadurecem e nunca mais voltam, outros voltam por força do destino, outros simplesmente recusam aceitar e ficam para sempre sob as asas dos mais responsáveis.
Seja lá o que for aquilo o que me espera, desejo só não acomodar.
Porque no fundo é muito bom voltar para casa, com aquele cheirinho de comida de mãe, aquela cama macia que tantos anos embalou o nosso sono, aquela voz forte ecoando – pai, aquela música infernal do filho, aquela brincadeira boba da filha... Pequenas coisas que vão ficando pelo caminho.
Mas procuro ter sempre em mente que meu lar está comigo, e eu desejo e espero mudar sempre – fugir do comodismo – porque quero evoluir, crescer, amadurecer e ir embora para um dia agradecer pessoalmente a Deus por todas estas coisas.
Quero que meu corpo mude, que meu espírito tome outras formas, que minha alma se esqueça de si mesma e aprenda sempre com humildade, apesar de muitas vezes haver um certo medo das mudanças.
E quando eu ficar relutante e não quiser me transformar, repetirei sempre: o mais importante levo comigo... Posso ter milhões de casas, mas somente Eu Sou meu lar!
Seja bem-vindo...!

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Os Olhos

Dipirona, voltarem, e um bom antibiótico não cura tudo!
Ao olhar do outro lado da mesa eu vejo olhos. Sim, olhos. Ansisos por respostas, ansiosos por alivio, temerosos pela vida, chorosos ao não ter um afago sincero.
Algumas coisas não são tocadas. São tão íntimas que nem ao menos podemos colocá-las em exposição durante 15 minutos de conversa breve, e muitas vezes vaga. E é com elas que talvez devessemos lidar de forma mais pura e sincera, pois é delas que provém o verdadeiro sentido de cura, de bem estar, de equilíbrio.
Da velinha com fraturas devido aos maus tratos do filho até a dorzinha  de cabeça que visita de vez em quando a dona de casa, qualquer doença tem implicações sobre o que se é. Em variáveis intensidades, mas o fato é que tem. Na maioria das vezes trabalhar essa dor nem é preciso, a mente faz o papel de cura para si mesma depois que o problema fisiológico foi resolvido. Mas e quando tudo é sobre a dor que não se pode tocar? Quando os olhos pedem desesperadamente que se pergunte com sinceridade como têm passado?
Confesso que sentar de qualquer lado da mesa não é confortante, pois a impossibilidade é o que reina. Um não diz como se sente, o outro muitas vezes evita a pergunta por não estar interessado de fato, ou por julgar não ser relevante. E assim a consulta segue, aquilo que não é dito continua sem ser dito, o presumido continua presumido. Assume-se a postura de Doutor, aquele cara que estudou anos para curar a sua doença como ninguém mais faria, e por isso não tem tempo a perder com aquilo que não é embasado pela boa e velha medicina conservadora.
Esquece-se dos olhos, aqueles que pisaram dentro daquele consultório esperançosos para que ao sair dali algo de fato mudasse. Eis que a relação médico-paciente torna-se sobre um distanciamento médico-paciente, pobre médico, pobre paciente. Ambos perdem, um deixa de amar o seu ofício, o outro torna-se descrente no alivio da dor, e novamente a consulta segue.
Por fim resta um papel em branco, preenchido com letras garranchais, o bom e velho voltarem, acompanhado da dipirona. O aperto de mão apressado, e novamente não se olha no olhos por cima da mesa. Segue-se um desejo de melhoras, muitas vezes despretensioso de seus verdadeiros votos.
A maior tristeza que se pode carregar é não amar o paciente que está a sua frente, mesmo que se possa fazê-lo apenas por 15 minutos, dedica-lhe esses precisos minutos, faça com que aquilo seja sobre eles, e não sobre dores e doenças somente. Faça com que seja sobre os olhos, pergunta aos olhos, olha nos olhos, e sorri de volta. As vezes a maior cura não é o alivio da dor, até porque essa muitas vezes nem pode ser resolvida, a maior cura está no fato de se importar de verdade. Mesmo que doa, mesmo que ao pisar fora do ambiente de trabalho sinta o peito carregado e a vontade incontrolável de chorar, leva contigo o amor incondicional e dedica-lhes aquilo que gostaria que fosse dedicado a ti.
Porque, no final, tudo é sobre os olhos, até que eles se fechem...



"Encontrei o paradoxo, que se você ama até doer, não há como ter mais dor, somente mais amor.”
                                                          Madre Teresa de Calcutá.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Café

- Ufa, deu tempo de pegar o café!
- Admite que você só correu pra poder me ver...
- Nem foi, era só pra matar o tempo mesmo, dei azar de te encontrar.
- Eu também te amo!
- Se um dia eu perder a mania de te zuar você para de gostar de mim, né?
- Acho que sim, aliás essa é uma das coisas que eu mais gosto em você. Sabe o que eu reparei?
- Lá vem, fala...
- As suas qualidades que eu mais gosto acho que você herdou do seu pai!
- Como assim?
- Sério, as coisas que reparei da personalidade dele, vejo todas em você. Você é bondoso, embora tenha um senso de justiça muito forte, que as vezes julga os outros de forma muito severa, mas que aplica a mesma regra a si mesmo.
- Traduz?!
- Basicamente você tem um coração enorme, e é certo com as coisas, por isso julga os outros, mas assumi as coisas erradas que faz. Eu vejo isso todo dia em você, seu bobão.
- Olha, você me analisando! Que bonitinha, tá parecendo eu falando...
- Bonitinha não, linda... E se você quer mais um elogio pro dia, eu digo que eu aprendo muito com você. Com tudo que a gente passou, e ainda vai passar. Você me guia, e eu valorizo muito isso em alguém. Além disso você é um excelente quase médico!
- O que você tá querendo?
- Nada não, só elogiando mesmo. Deixa eu ir, até mais tarde.
- Mulheres são estranhas mesmo, ainda desconfio das suas intenções, sabia?
- Aprende comigo um pouquinho então, o charme tá no mistério. Vai ficar desconfiando...
- To percebendo, senhora Linda!
- Tchau bobão
- Tchau...